E
então, de repente, os 38 dias de filmagem terminaram e chegou a hora
da festa de encerramento.
No
primeiro andar havia um longo balcão de bar, algumas mesas e uma
grande pista de dança. Uma escada levava a um andar superior.
Essencialmente, lá estavam a equipe e o elenco do filme, embora nem
todos estivessem e houvesse outras pessoas que eu não reconhecia.
Não tinha orquestra ao vivo e grande parte da música que saía dos
alto-falantes era discoteca, mas as bebidas no bar eram reais. Sarah
e eu entramos. Havia duas garçonetes. Eu pedi uma vodca e ela vinho
tinto.
Uma
das garçonetes me reconheceu e trouxe um dos meus livros. Dei o
autógrafo.
Estava
lotado e quente ali dentro, uma noite de verão, sem ar-condicionado.
– Vamos
pegar outra bebida e subir lá pra cima – sugeri a Sarah. – Está
quente demais aqui embaixo.
– Tudo
bem – ela disse.
Abrimos
caminho até a escada. Estava mais frio lá em cima e não havia
tanta gente. Algumas pessoas dançavam. Como festa, aquela parecia
não ter um núcleo, mas a maioria das festas era assim mesmo.
Comecei a ficar deprimido. Acabei minha bebida...
– Vou
pedir outro drinque – disse a Sarah. – Quer um?
– Não,
vá em frente...
Desci
a escada, mas antes de conseguir chegar ao bar um cara gordo e
redondo, muito cabeludo, óculos escuros, agarrou minha mão e
começou a sacudi-la.
– Chinaski,
eu li tudo que você já escreveu, tudo!
– É
mesmo?
Ele
continuava me sacudindo a mão.
– Tomei
um porre com você uma noite no Barney’s Beanery! Lembra de mim?
– Não.
– Está
dizendo que não se lembra de que tomou um porre comigo no Barney’s
Beanery?
– É.
Ele
ergueu os óculos e prendeu-os no alto da cabeça.
– Agora
se lembra?
– Não
– eu disse, puxei a mão e fui para o bar.
– Vodca
dupla – disse à garçonete.
Ela
trouxe.
– Eu
tenho uma amiga chamada Lola – disse. – Conhece?
– Não.
– Ela
diz que foi casada com você dois anos.
– Não
é verdade – eu disse.
Deixei
o bar, me dirigi à escada. Lá estava outro cara gordão, sem
cabelos mas com uma grande barba.
– Chinaski
– ele disse.
– Sim.
– André
Wells... Eu fiz uma ponta no filme... Também sou escritor... Tenho
um romance pronto pra publicar. Gostaria que você lesse. Posso te
enviar uma cópia?
– Tudo
bem... – Dei-lhe o número de minha caixa postal.
– Mas
não tem endereço próprio?
– Claro,
mas correspondência é com a caixa postal.
Encaminhei-me
para a escada. Bebi metade de meu drinque subindo os degraus. Sarah
conversava com uma extra. Aí vi Jon Pinchot. Estava parado sozinho
com seu copo. Fui até ele.
– Hank
– ele disse –, estou surpreso de ver você aqui...
– E
eu estou surpreso de a Firepower ter bancado a festa.
– Estão
cobrando...
– Oh...
Bem, e agora?
– Estamos
na sala de montagem, trabalhando na coisa... Depois disso, mixamos a
música... Por que não vem ver como se faz?
– Quando?
– Qualquer
hora. Estamos trabalhando de 12 a 14 horas por dia.
– Tudo
bem... Escuta, que aconteceu com Popppy?
– Quem?
– Aquela
que entrou com os dez mil paus quando você morava lá embaixo, na
praia.
– Oh,
está no Brasil agora. A gente cuida dela.
Acabei
meu drinque.
– Não
vai descer e dançar? – perguntou Jon.
– Oh,
não, isso é bobagem...
Alguém
o chamou.
– Desculpe
– ele disse –, e não esqueça de aparecer na sala de montagem.
– Claro.
Jon
afastou-se para o outro lado do salão.
Dirigi-me
à balaustrada e olhei o bar lá embaixo. Enquanto conversava com
Jon, Jack Bledsoe e seus companheiros motoqueiros haviam chegado. Os
companheiros recostavam-se no balcão do bar, de frente para a
multidão. Todos seguravam uma garrafa de cerveja, com exceção de
Jack, que tinha uma garrafa de 7-Up. Usavam blusões de couro,
echarpes, calças de couro, botas.
Aproximei-me
de Sarah.
– Vou
descer e falar com Jack Bledsoe e sua gangue... Você vem?
– Claro...
Descemos
e Jack nos apresentou os companheiros.
– Este
é o Harry Cassetete...
– Oi,
cara...
– Este
é o Flagelo.
– Oi...
– Este
é o Verme da Noite...
– Ei,
ei!
– Este
é o Mata-cachorro...
– É
demais!
– Este
é Eddie 3-Bagos...
– Porra...
– Este
é Peido-Rápido...
– Prazer
em conhecê-lo...
– E
o Terror das Xoxotas...
– Ééé...
E
foi isso aí. Todos pareciam ótimos praças, mas um pouco teatrais,
recostados no balcão, segurando as garrafas de cerveja.
– Jack
– eu disse –, você fez um grande trabalho de ator.
– E
como! – disse Sarah.
– Obrigado...
– ele lampejou seu belo sorriso.
– Bem
– eu disse –, vamos voltar lá pra cima, está quente pra caralho
aqui embaixo... Por que não dá uma subida?
Fiz
sinal à garçonete para tornar a encher nossos copos.
– Vai
escrever outro argumento? – perguntou Jack.
– Acho
que não... É muita perda de intimidade... Eu gosto de ficar sentado
olhando as paredes...
– Se
escrever um, me mostra.
– Claro.
Escute, por que seus rapazes estão de costas pro bar desse jeito?
Estão na paquera?
– Nãão,
já estão fartos de garotas. Só estão relaxando...
– Tudo
bem, tchau, Jack...
– Continue
fazendo seu bom trabalho – disse Sarah.
Voltamos
lá pra cima. Em pouco tempo, Jack e sua gangue desapareceram.
Não
foi lá uma grande noite. Eu subia e descia a escada, para pegar
drinques. Após três horas, quase todo mundo tinha ido embora. Sarah
e eu nos apoiávamos no balaústre. Aí eu vi Jon. Tinha-o visto
dançando antes. Chamei-o com um aceno.
– Ei,
que houve com Francine? Ela não veio à festa de encerramento?
– Não,
não tem imprensa aqui esta noite...
– Entendo...
– Preciso
ir agora – disse Jon. – Tenho de levantar cedo e ir pra sala de
montagem.
– Tudo
bem.
Jon
se foi.
Estava
vazio lá embaixo, e mais fresco, e assim descemos para o bar. Sarah
e eu éramos os últimos ali. Agora só havia uma garçonete.
– Vamos
tomar uma saideira – eu disse a ela.
– Agora
eu tenho de cobrar as bebidas – ela disse.
– Por
quê?
– A
Firepower só alugou a casa até a meia-noite... Já são meia-noite
e dez... Mas vou te passar uns drinques mesmo assim, porque gosto
muito do que você escreve, mas por favor não diga a ninguém que
fiz isso.
– Minha
querida, ninguém jamais vai saber.
Ela
serviu os drinques. A turma da discoteca da madrugada começava a
chegar. Era hora de ir embora. Era, sim. Nossos cinco gatos nos
esperavam. De alguma forma, eu me sentia triste pelo fim das
filmagens. Havia algo de explorativo naquilo tudo. Houvera um certo
jogo. Acabamos nossos drinques e saímos para a rua. O carro ainda
estava lá. Ajudei Sarah a entrar e entrei pelo outro lado. Pusemos
os cintos. Liguei o carro e logo estávamos na autoestrada do Porto,
seguindo para o sul. Voltávamos para a normalidade, e de certa forma
eu gostava disso, e por outro lado não gostava.
Sarah
acendeu um cigarro.
– A
gente dá comida aos gatos e vai dormir.
– E
talvez um drinque? – sugeri.
– Tudo
bem – disse Sarah.
Ela
e eu nos dávamos bem, às vezes.
Charles Bukowski, in Hollywood
Nenhum comentário:
Postar um comentário