Se
há uma coisa que é proibida num texto de saberes são as
reticências. As reticências indicam que a caminhada não chegou ao
fim. Mostram um caminho a ser seguido. São as reticências que dão
vida a uma conversa: elas são a permissão e o convite para que o
outro diga os seus pensamentos. Um texto de saber diz o resultado de
um processo de pensamento. Uma conversa, ao contrário, é o seu
oposto. Um resultado colocaria um fim à conversa. A conversa é um
movimento solto do pensamento e da fala – e, à medida que se
conversa, pensamentos não pensados vão se intrometendo, mudando o
curso da conversa, levando-a para um lado e para outro.
Esse
é um importante princípio da minha teoria de aprendizagem, que
encontrou forma poética num quase haicai da Adélia Prado: “Não
quero faca nem queijo; quero é fome”. Se o aluno tiver fome, ele
descobrirá o queijo e comerá, mesmo que seja necessário roubar e
sem o auxílio da faca. Mas, se não tiver fome, será inútil que
ele trabalhe numa loja de queijos. O mesmo princípio foi enunciado
por gente simples, da roça: “É fácil levar o burro até o
ribeirão. O difícil e convencê-lo a beber”. Eu teria de gastar
muitas páginas de argumentação científica para dizer isso que
digo de forma curta por meio de imagens. Há muitas coisas que a
ciência não consegue dizer.
Rubem Alves, in Do universo à jabuticaba
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