A
espada de fogo
O
sangue corre como água e está ácida de sangue a água de beber. De
comer, não resta mais que terra. Luta-se casa por casa, sobre as
ruínas e os mortos, de dia e de noite. Já vão três meses de
batalha sem tréguas. Só se respira pólvora e náuseas de cadáver;
mas ainda ressoam os atabaques e os tambores nas últimas torres e os
guisos de cascavel nos tornozelos dos últimos guerreiros. Não
cessaram ainda os alaridos e as canções que dão força. As últimas
mulheres empunham o machado de quem caiu.
O
imperador Cuauhtémoc chama o melhor de seus capitães. Coroa sua
cabeça com a coruja de longas plumas, e em sua mão direita coloca a
espada de fogo. Com esta espada na mão, o deus da guerra saiu do
ventre da mãe, lá no mais remoto dos tempos. Com esta serpente de
raios de sol, Huitzilopochtli tinha decapitado sua irmã, a lua, e
tinha despedaçado seus quatrocentos irmãos as estrelas, porque não
queriam deixá-lo nascer.
Cuauhtémoc
ordena:
– Que
a vejam nossos inimigos e que fiquem assombrados.
A
espada de fogo abre seu próprio caminho. O capitão escolhido
avança, sozinho, através da fumaça e dos escombros.
É
derrubado por um disparo de arcabuz.
Eduardo Galeano, in Os Nascimentos
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