Ele
chegou na praia numa terça-feira, que é um dia esquisito. Vieram do
banho de mar e deram com o pai na varanda. “Ué”, observaram.
Pouco depois chegou a mulher e também estranhou ele ali, numa terça
e com aquela cara. Pensou no pior.
“A
mamãe!” Não, não, a mãe dela estava bem, tudo na cidade estava
bem, ele sentira saudade, pegara o carro e viera para a praia. Só
isso. Mais tarde, longe das crianças, disse a verdade:
-
Me contaram que você tem um namorado.
A
mulher deu uma gargalhada. Mas quem é que tinha contado tamanha
bobagem?
-
Me contaram - disse ele, vago. E acrescentou: - Um surfista.
-
Eu, namorando um surfista?! A mulher não podia acreditar que ele
tinha acreditado numa história daquelas. Logo ela! Ele foi
dramático:
-
Me preocupo com as crianças.
-
Mas isso é uma loucura! Eu, namorando um garoto?
-
Eu não falei na idade do surfista - disse ele, como se isto a
incriminasse sem apelação.
Ela
tentou brincar:
-
Homem, aqui, só tem garoto, velho ou brigadiano.
Ele
não riu. Estava resignado. Talvez merecesse a infidelidade dela. Mas
se preocupava com as crianças. Ela o abraçou. Mas o que era aquilo?
Depois de tantos anos de casado, aquela desconfiança? Nunca tinham
desconfiado um do outro. Nunca.
Ela
o afastou. Disse:
-
Isso é coisa da Marjóri, não é? Aposto que é coisa da Marjóri.
Não. Não era coisa da Marjóri. Um telefonema anônimo. Ele se
esforçara para não dar importância ao telefonema. Se esforçara
para não acreditar. Mas não resistira.
-
Me desculpe...
Ela
o abraçou de novo, emocionada. Fez ele jurar uma coisa:
-
Nunca, mas nunca mais vamos desconfiar um do outro. Promete?
-
Prometo.
Abraçaram-se
e beijaram-se longamente, até uma das crianças vir mostrar o sapo
que achara no banheiro.
-
Você dorme aqui, hoje? - perguntou a mulher.
-
Não. Tenho um compromisso na cidade amanhã cedo.
Voltou
para Porto Alegre no fim da tarde. Seu compromisso era naquela noite
mesmo, e ela se chamava Maitê. Com a história do telefonema anônimo
tinha conseguido um habeas-corpus preventivo. Que diabo, pensou, com
o mundo neste estado, aquele podia ser o último verão da sua vida.
Mas não conseguiu nem encarar o guarda no pedágio.
Luís
Fernando Veríssimo,
in As
mentiras que os homens contam
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