Segundo
a expressão de Lavelle, a morte dá “a
todos os acontecimentos que a precederam esta marca do absoluto que
nunca possuiriam se não viessem a interromper-se”. O absoluto
habita em cada uma das nossas empresas, na medida em que cada uma se
realiza de uma vez para sempre e não será nunca recomeçada. Entra
na nossa vida através da sua própria temporalidade. Assim o eterno
torna-se fluido e reflui do fim ao coração da vida. A morte já não
é a verdade da vida, a vida já não é a espera do momento em que a
nossa essência será alterada. O que há sempre de incoativo, de
incompleto e de constrangedor no presente não é já um sinal de
menor realidade.
Mas
então a verdade de um ser já não é aquilo em que se tornou no fim
ou a sua essência, mas o seu devir ativo ou a sua existência. E se,
como Lavelle dizia em tempos, nos julgamos mais perto dos mortos que
amamos
do que dos vivos, é porque já nos não põem em dúvida e daqui
para o futuro podemos sonhá-los a nosso gosto. Esta piedade é quase
ímpia. A única recordação que lhes diz respeito é a que se
refere ao uso que faziam de si próprios e do seu mundo, o acento da
sua liberdade na incompletude da vida. O mesmo frágil princípio
faz-nos viver e dá ao que fazemos um sentido inesgotável.
Maurice
Merleau-Ponty,
in
O Elogio da Filosofia
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