Em
1967, depois de cinco anos ralando como músico da noite paulista e
nos bailes da vida, Milton Nascimento (1942) viu a roda da fortuna
girar a seu favor, quando a já popularíssima Elis Regina gravou a
sua “Canção do sal” e o encorajou a participar, como
intérprete, do II Festival Nacional de Música Popular Brasileira,
na TV Excelsior. Milton se classificou em quarto lugar com “Cidade
vazia”, de Baden Powell e Lula Freire, mas detestou a experiência
de ver colegas se digladiando na disputa e jurou nunca mais
participar dos festivais competitivos que empolgavam o país.
Promessa
feita e cumprida, certa noite o carioca mais mineiro do Brasil foi
surpreendido pelos telefonemas de parabéns de amigos. Para sua
surpresa, ele estava entre os selecionados no II Festival
Internacional da Canção, da TV Globo, com nada menos que três
músicas, inscritas à sua revelia pelo amigo Agostinho dos Santos.
Sabendo da decisão do compositor, Agostinho – um dos principais
intérpretes brasileiros –, pediu-lhe uma fita com “Morro Velho”,
“Travessia” e “Maria, minha fé” para mostrar a seu produtor
e inscreveu-as no festival.
O
resto é história. “Maria, minha fé”, interpretada por
Agostinho dos Santos, caiu na primeira eliminatória, mas as outras
duas, ambas na voz privilegiada de Milton, chegaram à finalíssima:
“Travessia” ficou com o segundo lugar (atrás de “Margarida”,
de Guttemberg Guarabyra) e “Morro Velho”, com o sétimo. De
quebra, Milton saiu do Maracanãzinho com o prêmio de melhor
intérprete. Aos 24 anos, também chamou a atenção dos convidados
internacionais que participavam do festival, como o produtor
americano Creed Taylor, com quem assinou um contrato para gravar nos
Estados Unidos. Como na canção que o consagrou, soltou a voz nas
estradas para não mais parar. Foi a sua travessia do anonimato ao
sucesso e ao prestígio.
“Travessia”
foi a primeira parceria de Milton com o mineiro Fernando Brant
(1946-2015), que até então nunca tinha escrito letras. Milton vinha
trabalhando numa canção que batizara de “O vendedor de sonhos”,
mas, empacado na letra, foi até Belo Horizonte em busca da ajuda do
amigo. Só depois de muita insistência, Brant concordou em tentar e
acabou também fazendo a sua travessia pessoal para se tornar um dos
mais importantes letristas brasileiros.
Nelson Motta, in 101 canções que tocaram o Brasil
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