quarta-feira, 16 de fevereiro de 2022

As fotografias

Cheguei com meus presentes. Cumprimentei Adriana. Ela estava sentada no centro do pátio, em uma cadeira de vime, rodeada pelos convidados. Vestia uma saia bem rodada, de organdi branco e com uma anágua engomada, cuja renda aparecia ao menor movimento, uma tiara de metal maleável com flores brancas no cabelo, umas botinas ortopédicas de couro e um leque rosado na mão. Aquela vocação para a desgraça, que eu tinha descoberto nela muito antes do acidente, não se notava em seu rosto.
Estavam Clara, Rossi, Cordero, Perfecto e Juan, Albina Renato, María, a de óculos, Bodoque Acevedo, com sua nova dentadura, os três garotos da finada, um loiro que ninguém me apresentou e a infeliz da Humberta. Estavam Luqui, o Anãozinho e o mocinho que foi namorado da Adriana, e que já não falava mais com ela. Mostraram-me os presentes: estavam dispostos em uma prateleira do quarto. No pátio, sob um toldo amarelo, tinham posto a mesa, que era bem comprida: duas toalhas a cobriam. Os sanduíches de verdura e presunto e os bolos muito bem elaborados despertaram meu apetite. Meia dúzia de garrafas de sidra, com seus copos correspondentes, brilhavam sobre a mesa. Fiquei com água na boca. Uma floreira com palmas-de-santa-rita laranja e outra com cravos brancos enfeitavam as cabeceiras.
Esperávamos a chegada de Spirito, o fotógrafo: não podíamos nos sentar à mesa nem abrir as garrafas de sidra, nem tocar nos bolos, até que ele chegasse.
Para nos fazer rir, Albina Renato dançou A morte do Cisne. Ela estuda dança clássica, mas dançou de brincadeira.
Fazia calor e havia moscas. As flores das catalpas sujavam as lajotas do pátio. Os homens com jornais, as mulheres com viseiras improvisadas ou leques: todo mundo se abanava ou abanava os bolos e os sanduíches. A infeliz da Humberta fazia isso com uma flor, para chamar atenção. Que vento pode produzir uma flor, por muito que se agite?
Durante uma hora de espera, em que a cada vez que soava a campainha da porta todos nos perguntávamos se era ou não Spirito chegando, nos entretivemos contando histórias de acidentes mais ou menos fatais. Algumas das vítimas tinham ficado sem o braço, outras, sem as mãos, outras, sem as orelhas. “Mal de muitos, consolo de alguns”, disse uma velhinha, referindo-se a Rossi, que tem um olho de vidro. Adriana sorria. Os convidados continuavam entrando. Quando chegou Spirito, abriram a primeira garrafa de sidra. Claro que ninguém a provou. Serviram-se várias taças e se iniciou o longuíssimo prelúdio ao esperado brinde.
Na primeira fotografia, Adriana, à cabeceira da mesa, procurava sorrir ao lado dos pais. Deu muito trabalho acomodar o grupo, que não era harmônico: o pai de Adriana era corpulento e bem alto, os pais franziam muito o cenho, segurando as taças no alto. A segunda fotografia não deu menos trabalho: os irmãozinhos, as tias e a avó se agrupavam desordenadamente ao redor de Adriana, tampando-lhe a cara. O coitado do Spirito tinha que esperar pacientemente o momento de sossego, em que todos ocupavam o lugar indicado por ele. Na terceira fotografia, Adriana brandia a faca para cortar um bolo que tinha seu nome, a data de seu aniversário e a palavra FELICIDADE escritos com merengue rosado, salpicado de jujubas.
Ela tinha que ficar de pé — disseram os convidados.
A tia objetou:
E se os pés saírem mal?
Não se preocupe — respondeu o amável Spirito —, se não ficarem bem, depois eu corto.
Adriana fez uma careta de dor e o coitado do Spirito teve que a fotografar de novo, afundada em sua cadeira, entre os convidados. Na quarta fotografia, só as crianças a rodeavam; permitiram que elas segurassem as taças erguidas, imitando os mais velhos. As crianças deram menos trabalho que os adultos. O momento mais difícil não tinha terminado. Era preciso levar Adriana ao quarto de sua avó, para que tirassem as últimas fotos. Entre dois homens, levaram-na na cadeira de vime e a deixaram no quarto, com as palmas-de-santa-rita e os cravos. Lá a puseram sentada em um divã, entre vários almofadões sobrepostos. No quarto, que media cinco por seis metros, havia aproximadamente quinze pessoas enlouquecendo o coitado do Spirito, dando-lhe indicações e aconselhando Adriana a respeito da posição que devia adotar. Ajeitavam seu cabelo, cobriam seus pés, adicionavam almofadões, colocavam flores e leques, erguiam sua cabeça, abotoavam-lhe a gola, botavam-lhe pó de arroz, pintavam seus lábios. Não se podia nem respirar. Adriana suava e fazia caretas. O coitado do Spirito esperou mais de meia hora, sem dizer uma palavra; em seguida, com muitíssimo tato, tirou as flores que tinham sido colocadas aos pés de Adriana, dizendo que a menina estava de branco, e que as palmas-de-santa-rita alaranjadas destoavam do conjunto. Com uma santa paciência, Spirito repetiu a consabida ameaça:
Agora vai vir o passarinho.
Acendeu as lâmpadas e tirou a quinta fotografia, que terminou em um trovejo de aplausos. Do lado de fora, as pessoas diziam:
Parece uma noiva, parece uma verdadeira noiva. Uma pena, as botinas.
A tia de Adriana pediu que fotografassem a menina com o leque de sua sogra na mão. Era um leque com renda Alençon e lantejoulas, cujas varetas de madrepérola tinham pequenas pinturas feitas à mão. O coitado do Spirito não achou de bom gosto introduzir na fotografia de uma menina de catorze anos um leque preto e triste, por mais valioso que fosse. Tanto insistiram que ele aceitou. Com um cravo branco em uma mão e o leque preto na outra, Adriana saiu na sexta fotografia. A sétima motivou discussões: se seria tirada dentro do quarto ou no pátio, junto ao avô osso duro de roer, que não queria sair de seu canto. Clara disse:
Se é o dia mais feliz da vida dela, como não vão fotografá-la perto do avô, que a ama tanto. — Em seguida, explicou: — Um ano atrás esta menina se debatia nos braços da morte, ficou paralítica.
A tia declarou:
Nós nos desvelamos para salvá-la, dormindo ao lado dela nos pisos frios dos hospitais, dando nosso sangue em transfusões, e agora, no dia de seu aniversário, vamos deixar passar o momento mais solene do banquete, nos esquecendo de colocá-la no grupo mais importante, ao lado de seu avô, que sempre foi seu preferido?
Adriana se queixava. Acho que pedia um copo d’água, mas estava tão agitada que não conseguia pronunciar palavra alguma; além disso, o estrondo que as pessoas faziam ao se movimentar e ao falar teria sufocado suas palavras, se ela as tivesse pronunciado. Dois homens a levaram outra vez ao pátio, na cadeira de vime, e a puseram junto à mesa. Nesse momento se ouviu, vinda de um alto-falante, a canção ritual de “Feliz aniversário”. À abeceira da mesa, ao lado do avô e do bolo com velinhas, posou para a sétima fotografia, com muita serenidade. A infeliz da Humberta conseguiu se meter no retrato, em primeiro plano, com suas omoplatas descobertas e despeitada como sempre. Eu a acusei em público pela intromissão e sugeri ao fotógrafo repetir a foto, o que ele fez de bom grado. Ressentida, a infeliz da Humberta foi para um canto do pátio; o loiro que ninguém me apresentou a seguiu e, para confortá-la, soprou algo em seu ouvido. Se não tivesse sido por essa infeliz, a catástrofe não teria acontecido. Adriana estava a ponto de desmaiar quando a fotografaram de novo. Todos me agradeceram. Abriram as garrafas de sidra; as taças transbordavam de espuma. Cortaram os dois bolos em fatias gordas, que se repartiam em cada prato. Essas coisas levam tempo e atenção. Algumas taças foram derramadas sobre a toalha de mesa: dizem que traz sorte. Com a ponta dos dedos, umedecemos a testa. Alguns mal-educados já tinham bebido a sidra antes do brinde. A infeliz da Humberta deu o exemplo, e passou a taça ao loiro. Foi só mais tarde, quando provamos o bolo e brindamos à saúde de Adriana, que percebemos que ela tinha dormido. A cabeça pendia do pescoço como um melão. Não era estranho que, sendo aquela sua primeira saída do hospital, o cansaço e a emoção a tivessem vencido. Algumas pessoas riram, outras se aproximaram e bateram em suas costas para acordá-la. A infeliz da Humberta, aquela estraga-prazeres, sacudiu um de seus braços e berrou:
Você está gelada.
Esse pássaro de mau agouro disse:
Ela está morta.
Algumas pessoas que estavam longe da cabeceira acharam que se tratava de uma brincadeira e disseram:
E como não vai estar morta, com este dia?
Bodoque Acevedo não largava de sua taça. Todos pararam de comer, menos Luqui e o Anãozinho. Outros, dissimuladamente, guardavam pedaços de bolo espremido e sem merengue no bolso. Como a vida é injusta! Em vez de Adriana, que era um anjinho, bem que podia ter morrido a infeliz da Humberta!

Silvina Ocampo, in A fúria

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