domingo, 3 de outubro de 2021

Pierre Reverdy

Retrato de Pierre Reverdy (1918), de Juan Gris

Nunca chamarei de mágica a poesia de Pierre Reverdy. Esta palavra, lugar-comum de uma época, é como um chapéu de farsante de feira: nenhuma pomba selvagem sairá de seu bojo para levantar voo. Reverdy foi um poeta material que designava e tocava inumeráveis coisas da terra e do céu. Designava a evidência e o esplendor do mundo.
Sua poesia em si era como um filão de quartzo, subterrâneo e esplêndido, inesgotável. Às vezes reluzia duramente, com fulgor de mineral negro, arrancado arduamente da terra espessa. Inesperadamente voava numa chispa fosfórica ou se ocultava em seu corredor de mina, longe da claridade mas preso à sua própria verdade. Talvez essa verdade, essa identidade do corpo de sua poesia com a natureza, esta tranquilidade reverdyana, esta autenticidade inalterável foi-lhe antecipando o esquecimento. Pouco a pouco foi considerado pelos outros como uma evidência, fenômeno natural, casa, rio ou rua conhecida, que não mudaria jamais de aspecto nem de lugar.
Agora que mudou de lugar, agora que um grande silêncio, maior que seu honorável e orgulhoso silêncio, o levou, vemos que já não está aqui, que este fulgor insubstituível se foi, sendo enterrado na terra e no céu.
Digo que seu nome, como anjo ressuscitado, fará cair algum dia as injustas portas do esquecimento.
Sem trombetas, aureolado pelo silêncio sonoro de sua grande e contínua poesia, o veremos no juízo final, no Juízo Essencial, deslumbrando-nos com a simples eternidade de sua obra.

Pablo Neruda, in Confesso que vivi

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