segunda-feira, 15 de março de 2021

O diamante

           Um dia, Maria chegou em casa da escola muito triste.
O que foi? — perguntou a mãe de Maria.
Mas Maria nem quis conversa. Foi direto para o seu quarto, pegou o seu Snoopy e se atirou na cama, onde ficou deitada, emburrada.
A mãe de Maria foi ver se Maria estava com febre. Não estava.
Perguntou se Maria estava sentindo alguma coisa. Não estava. Perguntou se estava com fome. Não estava. Perguntou o que era, então.
Nada — disse Maria.
A mãe resolveu não insistir. Deixou Maria deitada na cama, abraçada com o seu Snoopy, emburrada. Quando o pai de Maria chegou em casa do trabalho, a mãe de Maria avisou: — Melhor nem falar com ela...
Maria estava com cara de poucos amigos. Pior. Estava com cara de amigo nenhum.
Na mesa do jantar, Maria de repente falou: — Eu não valo nada.
O pai de Maria disse: — Em primeiro lugar, não se diz “eu não valo nada”. É “eu não valho nada”. Em segundo lugar, não é verdade. Você valhe muito. Quer dizer, vale muito.
Não valho.
Mas o que é isso? — disse a mãe de Maria. — Você é a nossa filha querida. Todos gostam de você. A mamãe, o papai, a vovó, os tios, as tias. Para nós, você é uma preciosidade.
Mas Maria não se convenceu. Disse que era igual a mil outras pessoas. A milhões de outras pessoas.
Só na minha aula tem sete Marias!
Querida... — começou a dizer a mãe.
Mas o pai interrompeu.
Maria — disse o pai —, você sabe por que um diamante vale tanto dinheiro?
Porque é bonito.
Porque é raro. Um pedaço de vidro também é bonito. Mas o vidro se encontra em toda parte. Um diamante é difícil de encontrar. Quanto mais rara é uma coisa, mais ela vale. Você sabe por que o ouro vale tanto?
Por quê?
Porque tem pouquíssimo ouro no mundo. Se o ouro fosse como areia, a gente ia caminhar no ouro, ia rolar no ouro, depois ia chegar em casa e lavar o ouro do corpo para não ficar suja. Agora, imagina se em todo o mundo só existisse uma pepita de ouro.
Ia ser a coisa mais valiosa do mundo.
Pois é. E em todo o mundo só existe uma Maria.
Só na minha aula são sete.
Mas são outras Marias.
São iguais a mim. Dois olhos, um nariz...
Mas esta pintinha aqui nenhuma delas tem.
É...
Você já se deu conta de que em todo o mundo só existe uma você?
Mas, pai...
Só uma. Você é uma raridade. Podem existir outras parecidas. Mas você, você mesma, só existe uma. Se algum dia aparecer outra você na sua frente, você pode dizer: é falsa.
Então eu sou a coisa mais valiosa do mundo.
Olha, você deve estar valendo aí uns três trilhões...
Naquela noite a mãe de Maria passou perto do quarto dela e ouviu Maria falando com o Snoopy: — Sabe um diamante?

Luís Fernando Veríssimo, in O santinho

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