Não
será, de certo, um nome novo, nem há de pretender ao mérito da
originalidade. Mas é, na sua singeleza e brevidade, um nome
bem-inspirado, bem-achado e bem-agoirado, um nome de feliz expressão
e excelentes promessas: todo um programa numa só palavra.
O
eco não mente, nunca mentiu, não pode mentir: estampa, duplica,
repercute os sons, os rumores, as vozes; recolhe do ambiente, e
transporta, alonga, renova as impressões, as vibrações, as
comoções da atmosfera: dá aos contactos e aos choques, às quedas
e aos sustos uma enunciação alada, veloz, instantânea como a dos
raios luminosos; descobre os ruídos sutis, escava os segredos
recônditos, reúne os gemidos esparsos, e das leves ou grandes
ondas, abafadas no solo, escondidas nas trevas, disseminadas no ar
forma as largas ressonâncias, os brados, os clamores, que animam o
espaço, abalam a terra, e anunciam o tempo.
Batizar-se
com a denominação de eco o mesmo importa que tomar a verdade, a
fidelidade, a imparcialidade, a incorruptibilidade por credo, por
vocação e por bandeira. Não se acharia, por mais que se buscasse,
para entrar ao jornalismo, a porta de um compromisso mais eloquente,
mais preciso, mais severo.
Servir
ao público de eco aos fatos, às coisas, às realidades
contemporâneas, e ser, do público para com ele mesmo, o eco dos
seus sentimentos, das suas aspirações, das suas necessidades: eis
aí tudo o que da imprensa poderia reclamar a mais exigente das
fórmulas do seu dever. E tudo isto se traduz, isso tudo se condensa
na escolha do nome, com que entra à liça este simpático e
esperançoso órgão de publicidade, em cuja tenda se agrupam, com
vivo amor ao trabalho e ardente fé no ideal, algumas consciências e
coragens comprovadas na luta pelas boas reivindicações humanas e
pela boa causa brasileira.
Dar
todos os ecos ao mal, e extinguir todos os ecos do bem: tal a empresa
em que, há quatro anos, se afervora o governo da nossa degradação,
e cujo sistema culminou, para a nossa miséria e vergonha nossa, nos
oito meses do infame estado de sítio que hoje acaba. Organizou-se a
mordaça, a surdez, a calafetagem. Puseram-se ao governo pés de lã,
porque se lhe não ouvissem os movimentos; acolchoaram-se-lhe as
paredes, para que se lhe não escutassem as conjuras;
algodoaram-se-lhe as casas fortes, a fim de se lhe não sentirem as
dilapidações; tomaram-se-lhe à estopa os vãos, as frestas, os
interstícios, com a censura, a intimidação e a cadeia, para se lhe
não saber dos arranjos, das agências, das aventuras mais ou menos
escabrosas; e, desta maneira, à força de sigilo e terror, se armou
a situação escusa, calada, enigmática, cujas caldeiras, vedadas à
menor escapa de vapor ou bulha, acumularam silenciosamente a
bancarrota, que nos acaba de estoirar.
Fossem
as eleições o eco do voto popular, fosse o congresso nacional o eco
da nação, fosse o governo o eco da lei, fossem os tribunais o eco
da justiça, fosse a tribuna o eco das consciências, fosse a
política o eco do patriotismo, fossem as manifestações públicas o
eco das manifestações particulares, fosse a nação o eco de si
mesma, não se houvessem abolido os ecos da moralidade e da honra, da
indignação e do pudor, recalcados hoje, pela compressão ou pela
corrupção, no seio do país, e não teríamos acordado agora ao
estupendo fracasso deste desmoronamento, sem saber como lhe conter a
voragem nem lhe lavar o opróbrio.
Dura
exigência, pois, o que ora se impõe à imprensa, de suprir ela só,
em si só concentrar, e extrair de si só todos esses ecos, que
emudeceram, que feneceram, que expiraram, dando-nos a sensação de
um ataúde bem-pregado, onde se sabe que os vermes estão
esfervilhando, mas não se ouve nada senão o silêncio sensível da
morte.
O
nome, pois, deste jornal nos soa como um símbolo, como a imagem do
renascimento que anelamos. Deus o ajude, para se desempenhar da sua
tarefa, colaborando na família dos bons, dos sãos, dos fortes, dos
que não empalidecem com ameaças, perigos ou sofrimentos, dos que,
neste momento, hão de responder aos sussurros do terror agonizante,
erguendo bem alto a fronte livre da imprensa.
Rui
Barbosa, in Antologia
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