quarta-feira, 17 de abril de 2019

Dai-me

Dai-me a casa vazia e simples onde a
luz é preciosa. Dai-me a beleza intensa
e nua do que é frugal.
Quero comer devagar e gravemente como
aquele que sabe o contorno carnudo e
o peso grave das coisas.

Não quero possuir a terra mas ser um com
ela. Não quero possuir nem dominar
porque quero ser: esta é a necessidade.

Com veemência e fúria defendo a fidelidade
ao estar terrestre. O mundo do ter perturba
e paralisa e desvia em seus circuitos o estar,
o viver, o ser.

Dai-me a claridade daquilo que é exatamente
o necessário. Dai-me a limpeza de que não
haja lucro. Que a vida seja limpa de todo
o luxo e de todo o lixo.

Chegou o tempo da nova aliança com a vida.
Sophia de Mello Breyner Andresen

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