Os
sentimentos vastos não têm nome. Perdas, deslumbramentos,
catástrofes do espírito, pesadelos da carne, os sentimentos vastos
não têm boca, fundo de soturnez, mudo desvario, escuros enigmas
habitados de vida mas sem sons, assim eu neste instante diante do teu
corpo morto. Inventar palavras, quebrá-las, recompô-las, ajustar-me
digno diante de tanta ferida, teria sido preciso, Lucas meu amor,
meus 35 anos de vida colados a um indescritível verdugo, alguém
Humano, e há tantos indescritíveis Humanos feito de fúria e
desesperança, existindo apenas para nos fazer conhecer o nome da
torpeza e da agonia. Mas indigno e desesperado me atiro sobre o vidro
que recobre a tua cara, e várias mãos, de amigos? de minha filha
adolescente? de meu pai? ou quem sabe as mãos de teus jovens amigos
repuxam meu imundo blusão e eu colo a minha boca na direção da tua
boca e um molhado de espuma embaça aquela cintilância que foi a tua
cara. Grito. Gritos finos de marfim de uma cadela abandonada tentando
enfiar a cabeça na axila de Deus. De uma cadela sim. Porque as
fêmeas conhecem tudo da dor, fendem-se ou são desventradas para dar
à luz e eu Lucius Kod neste agora me sei mais uma esquálida cadela,
a morte e não a vida escoando de mim, musgos finos pendendo dos
abismos, estou caindo e ao meu redor as caras pétreas, quem são?
amigos? minha filha adolescente? meu pai? teus jovens amigos? Caras
graníticas, ódio mudo e vergonha, palavras que vêm de longe,
evanescentes mas tão nítidas como fulgentes estiletes, palavras de
supostos éticos Humanos:
Constrangedor
Louco Demente
Absurdo
Intolerável
Ducente Deo
começo estes escritos deveria ter dito. Tendo Deus como guia, começo
estes escritos deveria ter dito.
Hilda
Hilst, in Rútilo nada
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