sábado, 26 de março de 2011

O Sal da Palavra

    

     Prólogo
     A brochura do livro
     Não está no meio;
     Sim, na mente.

     Renitência
     Às vezes o peixe
     Nos escapa à mão.
     Daí a relutância, persistência
     Necessária.


     Quem acendeu
     Os fachos das estrelas?

     O menino.
     Um menino equilibrista
     Numa mangueira,
     Bom de se ver.
     Frutos colhidos,
     Sugados até os ossos.

     Esse amarelo-ouro
     Não é de se pegar?

     Divagações
     A fala, eis o que sou,
     O meu discurso.
     A palavra, dita ou não,
     Vale. A palavra vã
     Também.

     As palavras do pai, mãe:
     “Não te falei?”, machuca.

     O compulsório
     Da vida
     É o fôlego.

     Há palavras insossas,
     Temperá-las é preciso.
     O sal da palavra
     Dá sabor ao dito.

     Na ponta
     Da língua
     Sinto o condimento
     Da palavra.

     Reminiscências
     O rio e seus reveses:
     Seco é o rio
     Da minha infância.
     Margem esquerda,
     Morada, 171,
     Dita rua de Baixo
     Oficial, D. Pedro II.
     Viva a anarquia
     Dos guris. Idos tempos.

     Chico Doido: olhos verdes
     Atentos, pernas
     Separadas, mãos ágeis
     Nos revólveres imaginários.
     Nosso Django. Passarim
     Grande. Um sopro
     O matou. Do coração.

     Os responsos
     De minha tia
     Não trouxeram de volta
     Os meus pertences
     Espirituais.

     A fé, esta,
     Onde está?

     Dualidade
     De que é feita
     A paixão
     -Cegueira tresloucada-
     Não nos foi dito.

     O amor, colóquio,
     Não se mede.

     Interregno
     Mire:
     O coqueiro, afeito ao solo,
     Buscando o céu.
     No mais, são insanas
     Verdades
     Ou mentiras ditas veras.

     É possível navegar
     No fio da faca.

     Fiar-me de quê?
     Os deuses são factíveis.

     O ideário do rio
     É o mar. O do
     Carrasco é a dor.

     Repare:
     De onde vem tamanho
     Sabor das
     Bagas
     Da graviola?

     O graveto flui,
     Reflui no redemoinho
     E é sorvido pela água.
     Ele somos nós.

     É forçoso dizer:
     Os últimos serão
     Os derradeiros. Quem
     Espera sempre
     Cansa.

     Peroração
     "Vá buscar a coisa
     Que está em cima
     Daquele negócio, menino.
     Vai logo, diacho".

     Sim, meu falar
     Já foi antes dito,
     Anotado, bisado, escrito,
     Recontado, reproduzido,
     E poderá ser dito,
     Anotado, bisado...

     Dizer a verdade
     Dói mais que mentir.

     Um rio é inconsútil
     Serpenteia nossos sonhos,
     Impregna
     Nossa secura.

     É com dissabor
     Que recebemos a dor.
     Mas o bem da casca
     De angico trava.
     Daí a alternância
     Bem mal bem mal bem mal.

     Telúrico
     O chão de minha terra
     É de pedregulho só.
     Será que fomos
     Feitos desse barro?
     Nuvens de pó
     E de garranchos.
     Oito meses abióticos,
     sinistros.

     Eu, pouco, meus
     Erros a mais.

     Tentâmen
     Sou introspecto:
     Logo, especulo,
     Filosofo. Daí
     Minha melancolia.

     A verdade
     (porque provável)
     está
     Na Matemática.

     O acúmulo
     Do vil metal
     É o cúmulo.

     Ao reprovar
     O autoritarismo
     Da extrema direita,
     Renego o da
     Esquerda.

Elilson José Batista, in Miscelânea Poética.
                

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