74.
Trovoada
Este ar baixo e nuvens paradas. O azul
do céu estava sujo de branco transparente.
O moço, ao fundo do escritório,
suspende um minuto o cordel à roda do embrulho eterno....
“Como está só me lembra de uma”,
comenta estatisticamente.
Um silêncio frio. Os sons da rua como
que foram cortados à faca. Sentiu-se, prolongadamente, como um
mal-estar de tudo, um suspender cósmico da respiração. Parara o
universo inteiro. Momentos, momentos, momentos. A treva encarvoou-se
de silêncio.
Súbito, aço vivo,
Que humano era o toque metálico dos
elétricos! Que paisagem alegre a simples chuva na rua ressuscitada
do abismo!
Oh, Lisboa, meu lar!
Fernando Pessoa, em Livro do Desassossego
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