terça-feira, 2 de dezembro de 2025

1599 – Santa Marta



Fazem a guerra para fazer o amor

A rebelião estala no litoral do Caribe e os trovões sacodem a serra Nevada. Os índios se alçam pela liberdade de amar.
Na festa da lua cheia, dançam os deuses no corpo do chefe Cuchacique e dão magia a seus braços. Dos povoados de Jeriboca e Bonda, as vozes da guerra despertam a terra toda dos índios tairona e sacodem Masinga e Masinguilla, Zaca e Mamazaca, Mendiguaca e Rotama, Buritaca e Tairama, Taironaca, Guachaca Chonea, Cinto e Nahuange, Maroma, Ciénaga, Dursino e Gairaca, Origua e Durama, Dibocaca, Daona, Chengue e Masaca, Daodama, Sacasa, Cominca, Guarinea, Mamatoco, Mauracataca, Choquenca e Masanga.
O chefe Cuchacique veste pele de onça. Flechas que assoviam, flechas que queimam, flechas que envenenam: os tairona incendeiam capelas, arrebentam cruzes e matam frades, lutando contra o deus inimigo que proíbe seus costumes.
No mais distante dos tempos, nestas terras se divorciava quem queria e faziam o amor os irmãos, se tinham vontade, e a mulher com o homem ou o homem com o homem ou a mulher com a mulher. Assim foi nestas terras até que chegaram os homens de negro e os homens de ferro, que lançam aos cães quem ama como os antepassados amavam.
Os tairona celebram as primeiras vitórias. Em seus templos, que o inimigo chama de casas do Diabo, tocam a flauta nos ossos dos vencidos, bebem vinho de milho e dançam ao som dos tambores e das trombetas de caracol. Os guerreiros fecharam todas as passagens e caminhos para Santa Marta, e se preparam para o assalto final.

Eduardo Galeano, em Os Nascimentos

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