Lugar
mais bonito de um passarinho ficar é a palavra.
Nas
minhas palavras ainda vivíamos meninos do mato,
um
tonto e mim.
Eu
vivia embaraçado nos meus escombros verbais.
O
menino caminhava incluso em passarinhos.
E
uma árvore progredia em ser Bernardo.
Ali
até santos davam flor nas pedras.
Porque
todos estávamos abrigados pelas palavras.
Usávamos
todos uma linguagem de primavera.
Eu
viajava com as palavras ao modo de um dicionário.
A
gente bem quisera escutar o silêncio do orvalho
sobre
as pedras.
Tu
bem quisera também saber o que os passarinhos
sabem
sobre os ventos.
A
gente só gostava de usar palavras de aves porque
eram
palavras abençoadas pela inocência.
Bernardo
disse que ouvira um vento quase encostadonas vestes da tarde.
Eu
sonhava de escrever um livro com a mesma
inocência
com que as crianças fabricam seus navios
de
papel.
Eu
queria pegar com as mãos no corpo da manhã.
Porque
eu achava que a visão fosse um ato poético
do
ver.
Tu
não gostasse do caminho comum das palavras.
Antes
melhor eu gostasse dos absurdos.
E
se eu fosse um caracol, uma árvore, uma pedra?
E
seu eu fosse?
Eu
não queria ocupar o meu tempo usando palavras
bichadas
de costumes.
Eu
queria mesmo desver o mundo. Tipo assim: eu vi
um
urubu dejetar nas vestes da manhã.
Isso
não seria de expulsar o tédio?
E
como eu poderia saber que o sonho do silêncio era
ser
pedra!
Manoel de Barros, em Menino do mato
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