segunda-feira, 8 de julho de 2024

Morrer, dormir, sonhar talvez

Sonhou que a dor pertinaz no baixo ventre, que ocultou para não importunar os demais (ou para que não o atormentassem), deixava de incomodá-lo. Sem resistência, a dor desapareceu. Sonhou que a cozinheira Eustólia, (oh, havia herdado de sua mãe esta velha maníaca) tinha ido viver com uma sobrinha e finalmente lhe estava permitido comer como Deus manda. A casa deixou de feder a alho. Sonhou o reencontro com Lavínia, sua nunca esquecida Lavínia, oportunamente livre. O casamento foi celebrado na intimidade. Sonhou que reunia uma vasta antologia sobre a inutilidade da apologia literária. O elogio dos críticos foi unânime. Sonhou o número que sairia premiado na loteria de Natal. Custou a encontrar o bilhete, mas sua fortuna ficou assegurada. Sonhou os ganhadores de todos os páreos nas próximas corridas no hipódromo de Palermo. Porém detestava as corridas de cavalo, um tio seu se tinha suicidado, etc. Sonhou que acordava. Porém não acordou. Já fazia alguns minutos que estava morto.

Eliseo Díaz, Notas sobre el azar, em Livro de Sonhos, de Jorge Luis Borges

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