sábado, 16 de dezembro de 2023

Como ele salvou minha vida



Edward Bloom salvou minha vida duas vezes. Que eu saiba.
A primeira vez foi quando eu tinha cinco anos e estava brincando no fosso atrás da nossa casa. Meu pai sempre me dizia: “Fique longe do fosso, William.” Ele me dizia isso sempre, como se soubesse que algo poderia acontecer, que talvez ele fosse obrigado a salvar a minha vida um dia. Para mim, aquilo não era um fosso, e sim um leito de rio antigo, quase seco, cheio de pedras pré-históricas, achatadas e alisadas pela água que corria sobre elas. A única água que havia lá agora era uma corrente constante, quase desprezível, que não tinha força nem para arrastar um galho.
Era lá que eu brincava, depois de ter escorregado pelo barro vermelho do aterro, às vezes poucos minutos depois de meu pai ter dito: “Fique longe do fosso, William.” A visão que tinha de mim mesmo, sozinho entre as paredes vermelhas e frescas, era suficientemente poderosa para eu desobedecer à sua ordem. No meu esconderijo secreto, eu me agachava, revirando as pedras, guardando as melhores no bolso, as brancas e as pretas e brilhantes com manchas brancas. Eu estava tão distraído lá naquele dia que não vi a parede de água vindo na minha direção, como se sua missão fosse arrastar-me dali com ela. Eu não a vi e nem ouvi. Estava agachado, de costas, examinando as pedras. E se não tivesse sido por meu pai, que de algum modo soube o que estava acontecendo antes mesmo de acontecer, eu teria mesmo ido embora junto com a água. Mas ele estava lá, e me puxou pela ponta da camisa até a margem, onde nós dois ficamos vendo passar um rio onde antes não havia nenhum rio, a espuma respingando em nossos pés. Finalmente, ele olhou para mim.
Eu disse para você ficar longe do fosso.
Que fosso? — respondi.

Na segunda vez que meu pai salvou minha vida tínhamos acabado de nos mudar para uma casa nova em Mayfair Drive. O antigo dono deixara um balanço, e enquanto os carregadores transportavam nossos sofás velhos e a mesa de jantar, resolvi ver que altura aquele balanço alcançava. Dei um impulso com toda a força, sacudindo o balanço. Infelizmente, o antigo dono não tinha deixado o balanço para trás; eles simplesmente ainda não o tinham levado. Haviam soltado os pés do cimento que o segurava no chão, então, ao balançar cada vez mais alto, eu estava na verdade carregando comigo o peso da armação, até que, ao chegar no ponto mais alto do arco, a armação tombou para a frente, projetando-me para fora do balanço na direção de uma cerca branca na qual eu certamente teria sido empalado. De repente, senti meu pai perto de mim; foi como se ele também voasse, e nós dois estivéssemos caindo juntos. Seus braços me abraçaram como uma capa, e eu caí no chão a seu lado. Ele tinha me arrancado do Céu e me depositado em segurança na Terra.

Daniel Wallace, in Peixe Grande

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