segunda-feira, 6 de novembro de 2023

Biologia é destino

A Freud.

Porque meu cérebro pesa
algumas gramas a menos
e meus músculos não alcançam
a potência
dos recordes masculinos
dizem:
que biologia é o destino
(destino ao serviço)

porque minhas glândulas
me condenam
a dessangrar a cada lua
e o cheiro e a cor
do meu sangue lembra
minha pouca natureza angelical
dizem:
que biologia é destino
(destino inferiorizante)

porque me falta
um sexo protuberante
entre as pernas,
que me libere do compromisso
de passos lentos
e saliente ventre
depois de um fugaz orgasmo,
dizem:
que biologia é destino
(destino para fralda, vassoura e cozinha).

Porque a história registra
milhares de nomes masculinos
e poucos de mulheres
que venceram as flamejantes espadas
dos arcanjos misóginos
de fama,
dizem:
que biologia é destino
(destino à ignorância)

E com tantas evidências,
devemos estar orgulhosas
quando nos elogiam magnanimamente
nos discursos oficiais
dizendo:
por trás de um grande homem
há sempre uma grande mulher
e esquecem
astutos e olímpicos —
de acrescentar
o qualificador justo
de: frustrada.

Luz Méndez de la Vega (Tradução de Elys Regina Zils)

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