Vin
Marbad vinha altamente recomendado por Michael Huntington, meu
fotógrafo oficial. Michael me fotografava constantemente, mas até
então não houvera muitos pedidos desses trabalhos.
Marbad
era consultor de impostos. Chegou uma noite com sua maleta, um
homenzinho moreno. Eu já bebia tranquilamente há algumas horas,
sentado com Sarah vendo um filme em minha velha TV preto e branco.
Ele
bateu com rápida dignidade e eu o deixei entrar, apresentei-o a
Sarah e servi-lhe vinho.
– Obrigado
– ele disse, tomando um gole. – Você sabe que, aqui na América,
se você não gasta dinheiro, eles tomam.
– Ééé?
Que quer que eu faça?
– Dê
uma entrada numa casa.
– Hum?
– Os
pagamentos das hipotecas são dedutíveis do imposto de renda.
– Ééé,
que mais?
– Compre
um carro. É dedutível.
– Todo?
– Não,
só um pouco. Deixa que eu cuido disso. O que a gente precisa é
criar pra você algumas proteções contra os impostos. Veja aqui...
Vin
Marbad abriu sua maleta e retirou muitas folhas de papel. Levantou-se
e aproximou-se de mim com elas.
– Bens
imóveis. Aqui, olhe, eu comprei um pouco de terra no Oregon. Isto é
um cancelamento de imposto. Ainda tem alguns hectares à venda. Você
pode entrar agora. Esperamos uma valorização de 25% cada ano. Em
outras palavras, dentro de quatro anos seu dinheiro dobra...
– Não,
não, por favor volte a sentar.
– Que
é que há?
– Não
quero comprar nada que eu não possa ver, não quero comprar nada que
não possa alcançar e tocar.
– Está
dizendo que não confia em mim?
– Eu
acabo de conhecer você.
– Eu
tenho recomendações em todo o mundo!
– Eu
sempre confio em meu instinto.
Vin
Marbad girou de volta ao sofá onde deixara seu casaco; enfiou-o e
lançou-se para a porta com sua maleta, abriu-a, saiu e fechou-a.
– Você
ofendeu ele – disse Sarah. – Ele só queria te mostrar algumas
maneiras de economizar dinheiro.
– Eu
tenho duas regras. Uma delas é: jamais confie num cara que fuma
cachimbo. A outra: jamais confie num cara de sapato lustroso.
– Ele
não fumava cachimbo.
– Bem,
parece um fumador de cachimbo.
– Você
ofendeu ele.
– Não
se preocupe, ele vai voltar...
A
porta escancarou-se, e lá estava Vin Marbad. Cruzou a sala apressado
até seu lugar original no sofá, tornou a tirar o casaco, pôs a
maleta a seus pés. Olhou-me.
– Michael
me disse que você joga nos cavalinhos.
– Bem,
ééé...
– Meu
primeiro emprego, quando cheguei aqui, da Índia, foi no Hollywood
Park. Era faxineiro lá. Sabe as vassouras que eles usam para varrer
os bilhetes usados?
– Sei.
– Já
notou como são largas?
– Já.
– Bem,
isso foi ideia minha. As vassouras eram do tamanho normal. Eu
desenhei a nova. Fui ao setor de Operações com ela e eles
aproveitaram. Fui promovido pra Operações e venho subindo desde
então.
Servi-lhe
outra bebida. Ele tomou um gole.
– Escuta,
você bebe quando escreve?
– Sim,
um bocado.
– Isso
é parte da sua inspiração. Vou fazer com que seja deduzido.
– Pode
fazer isso?
– Claro.
Sabe, fui eu que comecei a tornar dedutível a gasolina usada no
automóvel. Foi ideia minha.
– Filho
da puta – eu disse.
– Muito
interessante – disse Sarah.
– Dou
um jeito de você não pagar imposto nenhum e de modo legal.
– Parece
ótimo.
– Michael
Huntington não paga impostos. Pergunte pra ele.
– Acredito
em você. Abaixo os impostos.
– Tudo
bem, mas você tem de fazer o que eu digo. Primeiro, dê entrada numa
casa, depois num carro. Dê a largada. Arranje um carro bom. Um novo
BMW.
– Tudo
bem.
– Em
que máquina datilografa? Uma manual?
– É.
– Arranje
uma elétrica. É dedutível.
– Eu
não sei se consigo escrever numa elétrica.
– Você
se acostuma em poucos dias.
– Quer
dizer, não sei se consigo criar numa elétrica.
– Quer
dizer que tem medo de mudar?
– É,
ele tem – disse Sarah. – Veja os escritores do século passado,
eles usavam penas de aves. Naquele tempo, ele teria se apegado a
essas penas, teria lutado contra qualquer mudança.
– Penso
muito em minha maldita alma.
– Você
muda suas marcas de bebida, não muda? – perguntou Vin.
– Ééé...
– Tudo
bem, então...
Vin
ergueu sua taça, esvaziou-a.
Eu
servi mais vinho a todos.
– O
que a gente precisa é fazer de você uma Corporação, pra conseguir
todas as vantagens dos impostos.
– Isso
soa terrível.
– Eu
disse a você, se não quer pagar imposto tem de fazer como eu digo.
– Eu
só quero bater à máquina, não quero andar por aí carregando um
fardo enorme.
– Você
só tem de nomear um Conselho de Diretores, um Secretário, um
Tesoureiro, e por aí além... É fácil.
– Soa
horrível. Escuta, tudo isso soa como um monte de merda. Talvez eu me
dê melhor simplesmente pagando os impostos. Não quero ninguém me
enchendo o saco. Não quero o cara do imposto de renda batendo em
minha porta à meia-noite. Pago até mais pra garantir que me deixem
em paz.
– Isso
é idiotice – disse Vin. – Ninguém deve jamais pagar impostos.
– Por
que não dá uma chance a Vin? Ele só está querendo te ajudar –
disse Sarah.
– Veja,
eu mando pra você pelo correio os documentos da Corporação. É só
ler e assinar. Vai ver que não tem nada a temer.
– Essa
coisa toda, sabe, atrapalha. Estou trabalhando num argumento e
preciso ter as ideias claras.
– Um
argumento, hum? Sobre o que é?
– Um
bêbado.
– Ah,
você, hum?
– Bem,
tem outros.
– Consegui
fazer ele beber vinho agora – disse Sarah. – Estava quase morto
quando conheci ele. Uísque, cerveja, vodca, gim, ale...
– Já
sou consultor de Darby Evans há alguns anos. Você sabe, ele é
argumentista.
– Eu
não vou ao cinema.
– Ele
escreveu O Coelho que Saltou no Céu; Waffles com Lulu;
Terror no Zoo. Está fácil na casa dos seis dígitos. E é
uma Corporação.
Não
respondi.
– Não
tem pago um vintém de imposto. E é tudo legal...
– Dê
uma chance a Vin – disse Sarah.
Ergui
minha taça.
– Tudo
bem. Merda. A isso!
– Bom
garoto – disse Vin.
Esvaziei
meu copo e encontrei outra garrafa. Tirei a rolha e servi a todos.
Deixei
minha mente ir na coisa; você é um operador esperto. É astuto. Por
que pagar bombas que despedaçam crianças indefesas? Dirija um BMW.
Tenha uma vista do porto. Vote nos republicanos.
Então
me ocorreu outra ideia.
Não
estará você se tornando o que sempre odiou?
E
veio a resposta:
Merda,
você não tem dinheiro de verdade mesmo. Por que não brincar com
essa coisa de farra?
Continuamos
bebendo, comemorando alguma coisa.
Charles Bukowski, in Hollywood
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