Cuidei
que o pobre-diabo estivesse doido, e ia afastar-me, quando ele me
pegou no pulso, e olhou alguns instantes para o brilhante que eu
trazia no dedo. Senti-lhe na mão uns estremeções de cobiça, uns
pruridos de posse.
– Magnífico!
disse ele.
Depois
começou a andar à roda de mim e a examinar-me muito.
– O
senhor trata-se, disse ele. Joias, roupa fina, elegante e... Compare
esses sapatos aos meus; que diferença! Pudera não! Digo-lhe que se
trata. E moças? Como vão elas? Está casado?
– Não.
– Nem
eu.
– Moro
na rua...
– Não
quero saber onde mora, atalhou Quincas Borba. Se alguma vez nos
virmos, dê-me outra nota de cinco mil-réis; mas permita-me que não
a vá buscar à sua casa. E uma espécie de orgulho... Agora,
adeus; vejo que está impaciente.
– Adeus!
– E
obrigado. Deixa-me agradecer-lhe de mais perto?
E
dizendo isto abraçou-me com tal ímpeto que eu não pude evitá-lo.
Separamo-nos finalmente, eu a passo largo, com a camisa amarrotada do
abraço, enfadado e triste. Já não dominava em mim a parte
simpática da sensação, mas a outra.
Quisera
ver-lhe a miséria digna. Contudo, não pude deixar de comparar outra
vez o homem de agora com o de outrora, entristecer-me e encarar o
abismo que separa as esperanças de um tempo da realidade de outro
tempo...
– Ora
adeus! Vamos jantar, disse comigo.
Meto
a mão no colete e não acho o relógio. Ultima desilusão! o Borba
furtara-mo no abraço.
Machado de Assis, in Memórias Póstumas de Brás Cubas
Nenhum comentário:
Postar um comentário