quarta-feira, 22 de março de 2023

1493 – Barcelona | Dia de glória

Anunciam as trombetas dos heraldos. Soam os sinos e os tambores rufam alegrias.
O Almirante, recém-retornado das Índias, sobe a escadaria de pedra e avança sobre o tapete carmesim, entre os brilhos de seda da Corte que o aplaude. O homem que realizou as profecias dos santos e dos sábios chega ao estrado, se ajoelha e beija as mãos da rainha e do rei.
Lá de trás, irrompem os troféus. Cintilam sobre as bandejas as peças de ouro que Colombo trocou por espelhinhos e bonés vermelhos nos remotos jardins que brotaram do mar.
Sobre ramagens e folhagens, desfilam as peles de lagartos e serpentes; e atrás entram, tremendo, chorando, seres jamais vistos. São os poucos que ainda sobrevivem ao resfriado, ao sarampo e ao asco pela comida e pelo mau cheiro dos cristãos. Não chegam nus, como estavam quando se aproximaram das três caravelas e foram presos. Acabam de ser cobertos por calças, camisas e uns quantos papagaios que puseram em suas mãos e sobre suas cabeças e ombros. Os papagaios, depenados pelos maus ventos da viagem, parecem tão moribundos como os homens. Das mulheres e crianças capturadas, não sobrou nenhuma.
Escutam-se murmúrios no salão. O ouro é pouco e em nenhum lado se vê pimenta-negra, ou noz-moscada, ou cravo, ou gengibre; e Colombo não trouxe sereias barbudas ou homens com rabo, desses que têm um olho só e um único pé, tão grande o pé que erguendo-o se protegem dos sóis violentos.

Eduardo Galeano, in Os Nascimentos

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