Certa
vez quebrei a costela e, por meses, sentia dor ao me virar na cama ou
ficar na piscina. Pela primeira vez tive a percepção aguda do que
era ser velha. Depois esqueci. A certa altura, durante os anos sobre
os quais estou falando aqui, após uma sucessão de perturbações
visuais periódicas, três eletroencefalogramas, duas séries
completas de radiografias de crânio e pescoço, um teste de
tolerância à glicose de cinco horas, duas eletromiografias, uma
bateria de análises químicas e consultas com dois oftalmologistas,
um clínico geral e três neurologistas, fui informada de que a
doença não era de fato nos meus olhos, mas no sistema nervoso
central. Posso ou não sofrer com sintomas de dano neurológico por
toda a vida. Esses sintomas, que podem ou não aparecer, podem ou não
envolver meus olhos. Podem ou não envolver meus braços ou minhas
pernas, podem ou não ser incapacitantes. Os efeitos podem ou não
ser atenuados por injeções de cortisona. Era impossível prever. A
condição tinha um nome, o tipo de nome em geral associado ao
Teleton, mas o nome não significava nada e o neurologista não
gostava de usá-lo. O nome era esclerose múltipla, mas não tinha
significado. Era, de acordo com o neurologista, um diagnóstico
excludente, e não significava nada.
A
essa altura, a sensação que eu tinha não era de ser velha, mas de
ter aberto a porta para um estranho e descobrir que esse estranho
segurava uma faca. Em um diálogo de poucas frases no consultório de
um neurologista em Beverly Hills, o improvável havia se tornado
provável, a norma: coisas que só aconteciam com outras pessoas
podiam de fato acontecer comigo. Eu podia ser atingida por um raio,
arriscar comer um pêssego e ser envenenada pelo cianeto no caroço.
O fato surpreendente era o seguinte: meu corpo estava oferecendo um
equivalente psicológico do que vinha se passando na minha mente.
“Leve uma vida simples”, aconselhou o neurologista. “Não que
isso faça diferença.” Em outras palavras, era mais uma história
sem narrativa.
Joan Didion, in O álbum branco
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