Encontrei meu marido às três horas da
tarde
com uma loura oxidada.
Tomavam um guaraná e riam, os
desavergonhados.
Ataquei-os por trás com mão e palavras
que nunca suspeitei conhecer.
Voaram três dentes e gritei, esmurrei-os
e gritei,
gritei meu urro, a torrente de
impropérios.
Ajuntou gente, escureceu o sol,
a poeira adensou como cortina.
Ele me pegava nos braços, nas pernas, na
cintura,
sem me reter, peixe-piranha, bicho pior,
fêmea-ofendida,
uivava.
Gritei, gritei, gritei até a cratera
exaurir-se.
Quando não pude mais, fiquei rígida,
as mãos na garganta dele, nós dois
petrificados,
eu sem tocar o chão. Quando abri os
olhos,
as mulheres abriam alas, me tocando, me
pedindo graças.
Desde então faço milagres.
Adélia Prado
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