No
Jardim Zoológico, neste domingo azul, a girafa olha do alto para as
crianças, e parece convidá-las a um passeio no dorso. Há uma
escada perto, e se for encostada ao animal, Ricardo (Rick é o seu
apelido) poderá chegar até lá.
O
garoto mede a distância que vai do chão ao lombo, e julga-se em
condições de vencê-la. Uma vez lá em cima, cavalgando o pescoço,
e segurando-lhe os chifres, pedirá à girafa, depois de umas voltas
pelo Jardim, que o leve por aí, percorrendo o mundo.
Presa
há tanto tempo, a girafa há de estar ansiosa de liberdade. Não
será difícil transpor a cerca. Ela espera que Rick lhe proponha a
aventura. Ninguém se atreverá a travar-lhe os passos, e Rick vai
dirigi-la nos rumos que aprendeu no atlas escolar.
O
problema é descer de vez em quando, para Rick alimentar-se de
biscoitos, fazer necessidades e dormir. Camarada, a girafa irá se
deitando aos poucos, primeiro dobrando devagar as pernas, depois se
inclinando lentamente para o lado, e afinal arriando com suavidade a
carga infantil.
Mas
para subir outra vez, como se arranjaria ele? Escada não haverá.
Mesmo deitada, a girafa é difícil de subir. A imaginação não lhe
fornece recurso plausível. O sonho frustrou-se. Rick levanta o braço
direito e, com a mão espalmada em gesto de adeus à girafa que
gentilmente o convidara, esclarece:
— Muito
obrigado. Fica para outra ocasião, quando eu crescer.
Carlos
Drummond de Andrade,
in
Contos
plausíveis
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