sábado, 20 de junho de 2020

O homem que observou a reunião

5.1 São pessoas estranhas. Reúnem-se em volta de um móvel completamente desconhecido para mim e que assim descrevo: quatro pedaços de madeira, circulares, lisos, verticais, com a altura de mais ou menos um metro cada um, sustentando uma prancha plana, horizontal.
5.2 Essa reunião é feita numa posição invulgar, onde os corpos são auxiliados na sustentação por objetos que se amoldam a eles e que me parecem feitos de madeira e couro.
5.3 Imagine, primeiro um homem de pé. Agora, tentem vê-lo com o corpo dobrado na altura do joelho. Além dessa dobra haverá outra, na parte baixa dupla. O homem fica disposto como um degrau de escada.
5.4 Para não cair, porque nessa ridícula posição não há nenhum equilíbrio, o homem apoia seu corpo no dito objeto que tem uma prancha vertical, uma prancha horizontal perpendicular ao meio, sendo que a frente desta prancha é sustentada por dois pedaços de madeira, quadrados.
5.5 As costas do homem se apoiam nesta prancha vertical, a parte dupla baixa e parte das coxas se apoia na parte horizontal e as canelas acompanham as madeiras quadradas de sustentação.
5.6 O que me deixou assombrado foi a flexibilidade dos corpos, pois, como se sabe, é impossível ao ser humano dobrar pernas, braços e virar a cabeça em várias direções.
4.1 Observando atentamente estas pessoas em torno da mesa, pude descobrir que elas moviam a boca, emitindo sons e isto me deixou mais espantado ainda, porque os humanos não emitem som algum, ao contrário das girafas, que são faladoras e gritadeiras.
4.2 Ao mesmo tempo que produziam sons uns para os outros, numa espécie singular de comunicação (e é sabido que a comunicação entre humanos cessou há 50 anos, por total embotamento dos órgãos vocais), estes homens colocavam dentro da boca porções de substâncias que tinham aspecto variado. As consistências também eram diferentes. Havia grãos brancos, soltos, grãos boiando num líquido marrom, rodelas vermelhas com pontos amarelos, pedaços do que me pareceu couro.
4.3 Com o auxílio de objetos que tenho agora em mãos, rotulados com etiqueta para o devido exame em nossos laboratórios, aqueles seres colocavam as substâncias na boca.
4.4 Qual a necessidade daqueles objetos, se as substâncias poderiam mais facilmente serem levadas à boca utilizando-se apenas os dedos das mãos?
4.5 O primeiro objeto tem 24 cm de comprimento. Uma parte é uma lâmina de aço com um bordo cortante e outra parte é de madeira. O segundo objeto é também de aço. Uma lâmina fina que se estende por 20 cm e de repente se abre em quatro pontas. O terceiro objeto é composto também de uma lâmina fina que numa das pontas é mais largo e côncavo.
3.1 Estas substâncias eram colocadas em recipientes circulares, brancos, feitos de matéria rígida. Levo exemplar para exame pelos nossos cientistas.
3.2 Estes recipientes são de vários tamanhos. O que estranhei é que as substâncias eram transferidas de recipientes de cor cinza, brilhante, para estes brancos. Por que não usavam diretamente os recipientes cinzas?
3.3 Finalmente, amostras das substâncias que as pessoas levavam à boca. Como me pareciam orgânicas e sujeitas a perecibilidade congelei todas. Qual a finalidade destas substâncias? Por que eram colocadas na boca com tanto prazer?
Ignácio de Loyola Brandão, in Cadeiras proibidas

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