Certa
vez, um taxista carioca casado me revelou a sua tática infalível
para conquistar amantes.
Ele
entra em salas de bate-papo virtuais com o nickname “100%
Fiel”.
Em
segundos, chovem mulheres perguntando se é possível existir um
homem com o índice de fidelidade tão alto.
Feito
o contato, ele desenvolve o assunto, escuta desabafos, consola as
traídas que não confiam mais nos homens, conquista com a sua lábia
digital, convida-as para mudarem o papo para o Skype, troca fotos,
palavras de carinho e marca encontros.
Só
ao vivo, depois do ato, confessa que é casado.
Porque
ele está interessado em outras e as dispensa cinicamente.
Não
quer desenvolver uma relação com a sua… presa?
Está
se lixando se alimenta a desqualificação moral de seus pares
masculinos. Os fins justificam os meios.
E
ele pinga, de porto em porto, atrás de uma aventura sexual.
Armando,
profissional liberal, é daqueles caras que, se perguntarem que tipo
de mulher o atrai, ele responde: “As que respiram.”
Também
casado, é mais direto. Entra em sites de relacionamento com um
perfil falso. Procura comunidades como “mulheres divorciadas”,
“mulheres boêmias”, “mulheres que topam tudo”. Faz
comentários divertidos, abre tópicos polêmicos, provoca discussões
sobre a essência da fidelidade e a culpa cristã.
A
ironia é o seu leme.
As
que se seduzem pelas palavras provocativas de Armando, muitas também
com o perfil falso, fotos embaçadas ou ilustrações, são
convidadas a migrarem para o bate-papo de uma rede social.
Lá,
a relação é desenvolvida.
Fotos
verdadeiras são trocadas.
E
ele sempre confessa, de coração aberto, que é muito bem casado,
mas que gosta de se divertir.
Tem
contatos em outras capitais. Quando viaja a trabalho, marca encontros
com suas paqueras virtuais — algumas também casadas. Pede dicas de
bares charmosos, combina a noite. Bebem, dançam, e, no final, a
cartada: “Vamos para o meu hotel.”
Teve
problemas com uma jovem roqueira que disse que o Oasis é melhor do
que os Beatles. E que preferia ficar se amassando no canto escuro do
bar, a conhecer o quarto bem decorado do hotel em que ele se
hospedou.
Levou
um susto em Salvador, quando, depois de um agradável jantar à
beira-mar, foi com a conquista, que não parava de beber, para o
hotel, e, assim que entraram, recebeu um tapa na cara. “Você
gosta?”, ela perguntou. Sua resposta foi devolver um tapa na cara
dela, que riu e perguntou: “Tem mais birita nesse muquifo?”
Beberam,
se estapearam e transaram.
Ela
gritou muito.
E
ele decidiu nunca mais se hospedar em Salvador.
Por
que os homens traem?
Ficará
rico o neurolinguista ou terapeuta, autor de livros de autoajuda que
publicar uma obra que se disponha a desvendar o enigma. Certamente
esgotarão as edições expostas em livrarias de aeroporto.
É
instintivo?
Há
a máxima sociobiológica que afirma que o macho alfa da espécie
nasceu para espalhar os seus genes, popularmente conhecidos como
espermas, entre o maior número de úteros, popularmente conhecidos
como garotas, e assim garantir a proliferação e a consequente
sobrevivência da tribo.
Pode
haver uma interpretação darwinista nesse comportamento duvidoso. O
homem que trai se destaca sobre o que não trai, já que conquista
mais herdeiros e território. Portanto, a traição estaria no gene
masculino. Apesar de imoral, não é culpa do marido canalha. Seria
uma manifestação genética?
Aquele
que for flagrado, pode vir com essa: “Amor, não é o que você
está pensando. É hereditário. Culpe meus antepassados. E meus
cromossomos. Não te traí. Foi a sequência de aminoácidos que
herdei, que me levou para os braços de outra.”
Apenas
corre o risco de ouvir: “Amor, e desde quando você começou a se
considerar um macho alfa?”
Os
canalhas podem usar também argumentos freudianos. “Querida, o amor
pela minha mãe foi castrado pelo fato de haver o meu pai na jogada,
o que me causou transtornos irrecuperáveis. Não te traí. Me
vinguei. Eu não, meu inconsciente.”
Argumentos
nietzschianos não devem ser descartados: “Honey, Deus está
morto, o que nos deixa irresponsavelmente livres para quebrar todos
os contratos. Culpe a filosofia e a decadência dos sistemas
platônicos, não a mim.”
Talvez
filósofos menos niilistas possam ajudar: “Se a consciência
estiver seduzida pela sensação, chuchuzinho, um objeto pode ter uma
qualidade agora e pode ter outra depois. Foi Hegel quem disse. O que
você vê na minha camisa são cabelos de uma loira. Mas podem ser de
uma morena. Ou seja, seus.”
Mas
Amando segue outra doutrina, a da vida dupla em casa, e a do jogo
aberto fora dela. Afirma para seus casos que adora mulheres, não
consegue ser fiel, tem uma libido incontrolável e não sente
qualquer culpa.
E
a libido ficou latente num encontro que marcou recentemente, num
bairro afastado, com uma de suas conquistas virtuais, uma secretária
bilíngue, atraente, que aceitou a cantada de Amando e o seu estado
civil, escolheu o dia e a hora e apareceu pontualmente com uma roupa
muito sexy.
Apresentaram-se,
ela se sentou, pediu o mesmo drinque que ele, sorriu, acendeu um
cigarro, jogou a fumaça para o lado, olhou nos olhos do conquistador
e mandou:
“Você
não tem vergonha, cara? Um homem casado paquerando outras mulheres.
Faz isso rotineiramente? Ela sabe? E se ela também tivesse amantes,
você gostaria? Por que então está casado ainda, se parece
irrealizado sexualmente dentro de casa. Tem filhos? Se separe e fique
sozinho garanhando todas as mulheres da cidade. Não tem deveres com
a saúde estrutural do casamento? Acha certo? Você não presta,
sabia? Conheci caras como você. Vocês nos enojam…”
E
por aí foi.
Amando
pediu outro drinque.
Escutou
quieto toda a lição de moral.
Concordava
eventualmente com a cabeça.
Até
filou um cigarro da guardiã dos bons costumes.
Deixou
desabafar.
Não
interrompeu.
Quando,
enfim, exausta, ela ficou em silêncio, ele matou a bebida e disse:
“Conhece
algum motel aqui perto? Queria mostrar o que esse papinho me causou.
Garanto que você vai também se divertir.”
São
histórias reais que escuto por aí.
Se
ela foi?
O
que você acha?
Marcelo
Rubens Paiva, in As verdades que ela não diz
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