O
casal entrou na agência bancária, o rapaz mais jovem que a moça,
talvez mais afetivo, ou mais apaixonado; tentava abraçá-la e
beijá-la, ela se esquivava, mas não parecia tímida, e sim nervosa.
Eu
tinha que pagar uma conta e entrei na mesma agência, mas sem saber
por que, segui o par enamorado, que se dirigiu à sala de penhora,
uma sala pequena e abafada, cheia de gente ansiosa. A moça e o rapaz
deram uma olhada na sala, depois se entreolharam e foram embora.
Desisti
de seguir o casal e de pagar minha conta quando vi uma mulher gorda
gesticular diante do avalista de objetos penhorados. Sentei numa
cadeira vazia da primeira fileira e fiquei observando as pessoas.
Onde
há dívida, há tensão e angústia; quer dizer, há uma promessa de
literatura. Mas não pensava em literatura, pensava na mulher gorda,
que tirou a pulseira, os brincos e um colar e entregou tudo ao
avalista. Depois tirou um lenço de uma bolsa surrada e assoou o
nariz. Não esperou um minuto e perguntou:
“Quanto
vale?”
O
avalista observou as joias, examinou-as, olhou sem piedade para a
mulher: “Mil e setecentos. Talvez mil setecentos e cinquenta”.
“Só
isso?”
“Só.”
“Mas
o colar é de ouro.”
“Ouro
branco, dona. Vale menos.”
Quem
quisesse, podia ver a alça do sutiã vermelho e também as pintas e
manchas nas costas. Era uma mulher desleixada, visivelmente
endividada, talvez à beira da pobreza.
A
vida é essa sala de penhora, pensei.
A
mulher contou o dinheiro, assinou os documentos, pôs a bolsa na
mesinha do avalista e se curvou sobre o funcionário; ela permaneceu
uns segundos nessa posição, cochichando para ele; depois virou o
corpo para o lado, como se olhasse para a porta. Vi sua face direita,
um olho amarelado que combinava com o cabelo cor de fogo, mal
tingido. As lágrimas tinham devastado a maquiagem, as rugas do rosto
eram grandes que nem dobras.
Eu,
que não a conhecia, tive vontade de chorar, mas me controlei. Ela se
levantou, pôs a alça da bolsa no ombro direito e agarrou a bolsa
com a mão. Também me levantei, disfarçando, observando-a de
soslaio. Tomou água, demorou uns minutos ao lado do bebedouro,
voltou à sala de penhora e perguntou ao funcionário quanto ia pagar
de juros. O homem informou um número que não ouvi, ela reclamou,
ele disse em voz alta:
“Mas
é a mesma taxa das outras penhoras.”
“Um
absurdo, um assalto”, ela desabafou.
Os
seios, que eram enormes, cresceram. Só então reparei que ela era
alta, mais alta do que eu. Calçava sandálias de couro, só os dedos
do pé direito estavam pintados de vermelho.
Saiu
do banco e eu segui essa mulher endividada. Ela parou na calçada
para ajeitar o cabelo, abriu a bolsa, tirou um grampo, nem teve tempo
de perceber a mão furtiva agarrar a alça e arrancar a bolsa, uma
mão ágil e habilidosa de um rapaz que já atravessava a rua e
corria ao encontro de uma moça que o esperava.
Reconheci
o casal que havia entrado no banco. Os outros passantes cercaram a
vítima, ninguém perseguiu os assaltantes, não havia policiais por
ali, os seguranças do banco não se moveram.
Um
homem idoso perguntou se ela estava bem.
“Ele
roubou uma bolsa velha”, ela disse, rindo. “Esses bandidos pensam
que eu sou idiota.”
Ninguém
entendeu o que ela queria dizer. Sem parar de rir, sem conseguir
parar de rir, ela tirou um envelope do sutiã vermelho e gritou: “Era
isso o que aquele safado queria… O dinheiro para pagar a faculdade
do meu filho. O dinheiro e os meus documentos estão aqui dentro”.
Ela
estava transtornada, mas alegre. Não se conteve e chorou aos
prantos. Talvez por ter garantido o futuro do filho. Ou, quem sabe,
por ter enganado um gatuno amador.
Milton
Hatoum, in Um solitário à espreita
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