Kierkegaard,
filósofo dinamarquês, o primeiro que li, observou que toda fala
contém duas coisas. Primeiro, aquilo que se diz, a mensagem que devo
comunicar. Segundo, uma música, um jeito de falar, andamento, os
pianíssimos, os fortíssimos. Para ele, é na música da fala que
nós moramos, é ali que se encontra a nossa alma. Uma mesma mensagem
pode ser dita ao som dos tambores ou do oboé. Lendo Kierkegaard
aprendi isso intelectualmente. Na minha prática de psicanalista
aprendi isso existencialmente. Eu tinha uma paciente que falava num
dia em tom maior, no outro, em tom menor. Só de ouvir a música da
sua fala, sem prestar atenção naquilo que ela estava dizendo, eu
sabia como estava a sua alma. (É importante que um terapeuta não
preste muita atenção naquilo que o seu cliente diz, a fim de ouvir
aquilo que ele não diz...) Moramos na música das palavras. Somos
amados não pelo que dizemos, mas pela música com que o dizemos.
Preste atenção na sua música. Se a sua música não tiver pausas
mansas, isso é sinal de que você é um chato que não deixa o outro
falar nem ouve o que ele tem para dizer. Deveria haver uma terapia
que ajudasse as pessoas a mudar a música de sua fala. Se conseguir
mudar a música da sua fala, você ficará diferente. Isso é
especialmente importante para os professores, para os pais, para os
amantes... Só por curiosidade, ligue a sua televisão num programa
em que algum deputado esteja discursando. Como eles gritam e sacodem
o dedo! São tão eloquentes... Quando você for procurar um
candidato a qualquer cargo eletivo, não preste atenção no que ele
diz, porque todos eles dizem a mesma coisa. Preste atenção na
música da sua fala…
Rubem
Alves, in Ostra feliz não faz pérola
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