As
crianças, que dormem três na mesma cama, estendem seus braços na
direção de uma vaca voadora. Papai Noel traz um saco de pão, e não
de brinquedos. Aos pés de uma árvore, mendiga uma mulher. Debaixo
do sol vermelho, um esqueleto conduz um caminhão de lixo. Pelos
caminhos sem fim, andam homens sem rosto. Um olho imenso vigia. No
centro do silêncio e do medo, fumega um caldeirão popular.
O
Chile é este mundo de trapos coloridos sobre um fundo de sacos de
farinhas. Com sobras de lã e velhos farrapos bordam as bordadeiras,
mulheres dos subúrbios miseráveis de Santiago. Bordam arpilleras,
que são vendidas nas igrejas. Que exista quem as compre é coisa
inacreditável. Elas se assombram:
– Nós
bordamos nossos problemas, e nossos problemas são feios.
Primeiro
foram as mulheres dos presos. Depois, muitas outras se puseram a
bordar. Por dinheiro, que ajuda a remediar; mas não só pelo
dinheiro. Bordando arpilleras as mulheres se juntam, interrompem a
solidão e a tristeza e por umas horas quebram a rotina da obediência
ao marido, ao pai, ao filho macho e ao general Pinochet…
Eduardo
Galeano, in Mulheres
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