Como
é que uma coisa ruim vira coisa boa, e só é boa se continuar a ser
ruim? Não, não pensem que endoidei. Vou contar o que aconteceu.
Esses dias de outono, céu muito azul, um friozinho gostoso, as cores
mais brilhantes... Me lembrei, com saudade, da minha infância em
Minas. Lembrei-me que, quando chegava o mês de julho, mês de
férias, era o tempo de tomar Emulsão de Scott. Para quem não sabe,
Emulsão de Scott é um fortificante à base de óleo de fígado de
bacalhau. Branco, pastoso, difícil de engolir, malcheiroso, gosto
ruim. Vinha a minha mãe com a colher de Emulsão de Scott numa mão
e uma tampa de laranja na outra, pra tirar gosto e cheiro. Pois não
é que fiquei com saudade da Emulsão de Scott! Pensei, então, que
eu gostaria de tomar Emulsão de Scott para voltar, na imaginação,
à minha infância. Fui à farmácia, comprei um vidro e preparei-me.
Mas, oh! decepção! Os laboratórios estragaram a emulsão. Deixou
de ser branca. Está cor-de-rosa! E o que fizeram com o gosto ruim de
óleo de fígado de bacalhau? Estragaram-no com sabor doce de
morango! Fracassou minha programada volta à infância! Porque
Emulsão de Scott, para ser boa, para ter poderes mágicos, tem de
ser ruim…
Rubem
Alves, in Ostra feliz não faz pérola
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