-
Deus do céu, meu sobrinho, este pano ainda está aqui? - disse o
velho comerciante eslavo, quando, ao mexer na prateleira de fazendas,
encontrou uma peça que tinha colocado ali há mais de seis meses.
-
Mas, tio, como é que eu posso vender essa fazenda? -
perguntou-respondeu o sobrinho. - Está velha, manchada, mofada, e o
padrão saiu de moda há muito tempo.
-
Ora, meu caro sobrinho, vendendo. Olha! Vem a calhar. Veja e aprenda
- disse o velho fazendeiro ao ver entrar na loja uma velhinha,
daquelas que, a essa altura, nem velhinha deveria ser mais.
-
Que deseja, minha senhora? - falou ele, cheio de mesuras. E, antes
que a velhinha se explicasse em sua voz já longínqua, passou a
mostrar rolos e rolos de fazenda, sem mostrar, naturalmente, a que
pretendia mesmo vender, mas deixando sempre que ficasse bem visível
aos olhos da velhinha. E, como os leitores já adivinharam, depois de
algum tempo a velhinha saía da loja com a peça de fazenda velha e
mofada, tendo pago por ela o dobro do preço que pagaria por uma peça
nova. Mas aparentemente convencida do que lhe dissera o vendedor:
estava comprando uma raridade inglesa, um desenho único, etcétera,
etcétera, etcétera. Quando a velha saiu, o velho mercador mostrou
pro sobrinho a nota de quinhentão que ela deixara e lhe deu a lição
definitiva e eterna da história do comércio:
-
Vê, meu sobrinho, uma mercadoria jamais se vende pelas suas
qualidades, mas sim pelas qualidades do vendedor. A mercadoria tem o
valor de quem a propõe no mercado.
O
garoto olhou a nota espantado e disse ao tio:
-
Maravilhoso, meu tio, e profundamente verdadeiro. Mas tem também o
valor da malandragem do comprador que faz sempre o preço da
mercadoria reverter a seu valor verdadeiro. Vê só, tio: a velhinha
pagou ao senhor uma nota falsa. Bota os óculos.
MORAL:
Não há vitória definitiva.
Millôr
Fernandes,
in Fábulas
Fabulosas
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