quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

A gente se acostuma até com o ruim

Como você era tratado em McAlester?
Oh, muito bem até. Tinha comida na hora certa, e roupa limpa e podia tomar banho. É um lugar bem confortável. Só o que era ruim era a falta de mulher. — Joad riu baixinho. — Uma vez um sujeito saiu de lá, em liberdade condicional, e um mês depois tava voltando. Então perguntaram pra ele: escute, por que você voltou? E ele disse: ora, por quê. Quando cheguei na casa de meus velhos fiquei mal como o diabo. Lá não tinha luz elétrica, nem chuveiro, nem nada. Não tinha livros pra gente ler e a comida era braba que lhe digo! Aqui, sim. Tinha de tudo. Então diss’que voltava pra onde tinha conforto e onde podia comer. Se sentiu muito mal em liberdade, sem saber o que fazer. Aí roubou um carro pra poder voltar. — Joad enrolou um cigarro, acendeu-o. — O sujeito não deixa de ter razão — disse. — Inda ontem de noite fiquei atarantado, pensando onde eu ia dormir. Comecei a pensar no que meu companheiro de cela faria. Eu e meus colegas da prisão tínhamos uma banda, e das boas. Alguém até disse que a gente devia tocar no rádio. E hoje de manhã não sabia a que horas me levantar. Fiquei esperando o sino tocar.
Casy riu, cacarejante.
Quando a gente se acostuma, até o barulho de uma serraria faz falta.
John Steinbeck, in As vinhas da ira

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