sexta-feira, 23 de outubro de 2015

O porquinho de Pírron

O filósofo Pírron, encontrando-se num barco num dia de grande tormenta, mostrava aos que via mais apavorados ao seu redor um porquinho que lá estava, nem um pouco preocupado com aquela tempestade, e encorajava-os com o seu exemplo. Ousaremos dizer então que esse privilégio da razão, que tanto celebramos e por causa do qual nos consideramos donos e imperadores do restante das criaturas, tenha sido colocado em nós para tormento nosso? De que adianta o conhecimento das coisas se com isso perdemos o repouso e a tranquilidade que sem ele teríamos, e se nos torna de condição pior do que o porquinho de Pírron? A inteligência que nos foi dada para nosso maior bem, empregá-la-emos para nossa ruína, lutando contra o desígnio da natureza e contra a ordem universal das coisas, que indica que cada qual use os seus instrumentos e meios para benefício próprio?”
Michel de Montaigne, in Ensaios

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