Serra
Geral do Tocantins, por Luciano Candisani
Nesta
trepidante cultura nossa, da agitação e do barulho, gostar de
sossego é uma excentricidade.
Sob
a pressão do ter de parecer, ter de participar, ter de adquirir, ter
de qualquer coisa, assumimos uma infinidade de obrigações. Muitas
desnecessárias, outras impossíveis, algumas que não combinam
conosco nem nos interessam.
Não
há perdão nem anistia para os que ficam de fora da ciranda: os que
não se submetem mas questionam, os que pagam o preço da sua
relativa autonomia, os que não se deixam escravizar, pelo menos sem
alguma resistência.
O
normal é ser atualizado, produtivo e bem informado. É indispensável
circular, ser bem-relacionado. Quem não corre com a manada,
praticamente nem existe, se não tomar cuidado, põem-no numa jaula:
um animal estranho.
Pressionados
pelo relógio, pelos compromissos, pela opinião alheia, disparamos
sem rumo – ou por trilhos determinadas – como hamsters que se
alimentam da sua própria agitação.
Ficar
sossegado é perigoso: pode parecer doença. Recolher-se em casa ou
dentro de si mesmo ameaça quem apanha um susto de cada vez que
examina a sua alma.
Estar sozinho é considerado humilhante, sinal de que não “se arranjou” ninguém – como se a amizade ou o amor se “arranjasse” numa loja.
Estar sozinho é considerado humilhante, sinal de que não “se arranjou” ninguém – como se a amizade ou o amor se “arranjasse” numa loja.
Além
do desgosto pela solidão, temos horror à quietude. Pensamos logo em
depressão: quem sabe terapia e antidepressivos? Uma criança que não
brinca ou salta ou participa de atividades frenéticas está com
algum problema.
O
silêncio assusta-nos por retumbar no vazio dentro de nós. Quando
nada se move nem faz barulho, notamos as frestas pelas quais nos
espiam coisas incômodas e mal-resolvidas, ou se observa outro ângulo
de nós mesmos. Damo-nos conta de que não somos apenas figurinhas
atarantadas correndo entre a casa, o trabalho e o bar, a praia ou o
campo.
Existe
em nós, geralmente nem percebido e nada valorizado, algo para além
desse que paga contas, faz amor, ganha dinheiro, e come, envelhece, e
um dia (mas isso é só para os outros!) vai morrer. Quem é esse que
afinal sou eu? Quais os seus desejos e medos, os seus projetos e
sonhos?
No
susto que essa ideia provoca, queremos ruído, ruídos. Chegamos a
casa e ligamos a televisão antes de largarmos a carteira ou a pasta.
Não é para assistirmos a um programa: é pela distração.
O
silêncio faz pensar, remexe águas paradas, trazendo à tona sabe
Deus que desconcerto nosso. Com medo de vermos quem – ou o que –
somos, adiamos o confronto com a nossa alma sem máscaras.
Mas,
se aprendermos a gostar um pouco de sossego, descobrimos – em nós
e no outro – regiões nem imaginadas, questões fascinantes e não
necessariamente negativas.
Nunca esqueci a experiência de quando alguém me pôs a mão no ombro de criança e disse:
Nunca esqueci a experiência de quando alguém me pôs a mão no ombro de criança e disse:
Fica
quietinha um momento só, escuta a chuva a chegar.
E ela chegou: intensa e lenta, tornando tudo singularmente novo. A quietude pode ser como essa chuva: nela nos refazemos para voltarmos mais inteiros ao convívio, às tantas frases, às tarefas, aos amores.
E ela chegou: intensa e lenta, tornando tudo singularmente novo. A quietude pode ser como essa chuva: nela nos refazemos para voltarmos mais inteiros ao convívio, às tantas frases, às tarefas, aos amores.
Então,
por favor, deem-me isso: um pouco de silêncio bom, para que eu
escute o vento nas folhas, a chuva nas lajes, e tudo o que fala muito
para além das palavras de todos os textos e da música de todos os
sentimentos.
Lya
Luft,
in
Pensar
é transgredir
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