"Não
te ponhas a pedir o que não pretendes obter!" É que sucede
muitas vezes nós pedirmos com empenho coisas que recusaríamos se
alguém no-las oferecesse. Por ligeireza? Por excesso de gentileza?
Seja qual for a razão, apliquemos-lhe um castigo: acedamos
largamente ao pedido. Muitas coisas nós desejamos parecer
querer
quando de fato as não queremos. Numa leitura pública, um autor
levou uma vez uma obra histórica enorme, escrita em letra miudinha,
num volume densíssimo, e, depois de ler a maior parte, disse: "Se
querem, fico por aqui." Ora os auditores, embora o seu único
desejo fosse que o homem se calasse imediatamente, gritaram em coro:
"Continua a leitura, continua!" Muitas vezes, também,
queremos uma coisa mas escolhemos outra, e nem sequer aos deuses
confessamos a verdade; o que vale é que os deuses ou não nos
atendem ou têm pena de nós! Quanto a mim, vou proceder sem qualquer
compaixão: vou mandar-te uma carta gigantesca! Se te custar muito
lê-la, não terás mais do que dizer: "Bonito serviço que eu
arranjei!", e põe o teu nome entre o daqueles homens que se
desfizeram em galanteios para casar com uma megera, ou se fartaram de
suar para conseguir riquezas e nelas só encontraram angústias, ou
usaram todos os truques e esforços para obter cargos públicos em
que se sentem destroçados, em suma, inclui-te na lista dos artífices
dos próprios dissabores!
Sêneca,
in
Cartas a Lucílio
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