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Um dia, um professor comovido falava-me de árvores.
Seu avô conhecera Andersen, esse pequeno deus que encantou para sempre a
infância, todas as infâncias, com suas maravilhosas historias. Mas, além de
conhecer Andersen, o avô desse comovido professor legara a seus descendentes
uma recordação extremamente terna: ao sentir que se aproximava o fim de sua
vida, pediu que o transportassem aos lugares amados, onde brincara em menino,
para abraçar e beijar as árvores daquele mundo antigo – mundo de sonho, pureza,
poesia – povoado de crianças, ramos, flores, pássaros... O professor comovido
transportava-se a esse tempo de ternura, pensava nesse avô tão sensível, e
continuava a participar, com ele, dessa cordialidade geral, desse agradecido
amor à Natureza que, em silêncio, nos rodeia com a sua proteção, mesmo obscura
e enigmática.
Lembrei-me de
tudo isso ao contemplar uma árvore que não conheço, e cujo tronco há quinze
dias se encontra ferido, lascado pelo choque de um táxi desgovernado. Segundo
os técnicos, se não for socorrida, essa árvore deverá morrer dentro em breve:
pois a pancada que a atingiu afetou-a na profundidade de sua vida.
Cecília Meireles, In O que se diz e o que se entende.
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