sábado, 17 de março de 2012

Canção do ver - 3

Por forma que o dia era parado de poste. 
Os homens passavam as horas sentados na 
porta da Venda 
de Seo Mané Quinhentos Réis 
que tinha esse nome porque todas as coisas 
que vendia 
custavam o seu preço e mais quinhentos réis. 
Seria qualquer coisa como a Caixa Dois dos 
prefeitos. 
O mato era atrás da Venda e servia também 
para a gente desocupar. 
Os cachorros não precisavam do mato para 
desocupar 
Nem as emas solteiras que despejavam correndo. 
No arruado havia nove ranchos. 
Araras cruzavam por cima dos ranchos 
conversando em ararês. 
Ninguém de nós sabia conversar em ararês. 
Os maridos que não ficavam de prosa na porta 
da Venda 
Iam plantar mandioca 
Ou fazer filhos nas patroas. 
A vida era bem largada. 
Todo mundo se ocupava da tarefa de ver o dia 
atravessar. 
Pois afinal as coisas não eram iguais às cousas? 
Por tudo isso, na Corruptela parecia nada 
acontecer.
 
Manoel de Barros, in Poemas Rupestres.

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