A imagem do Nordeste
brasileiro esteve durante muito tempo estereotipada no Sul do país, para os de
baixo o povo do norte como eles também chamavam era uma gente profundamente
religiosa, mística, ainda o é, mas também exótica em seus costumes, fazia parte
de um Brasil impenetrável e desconhecido, principalmente no final do século XIX
e início do século XX. As atenções para seus graves problemas sociais vieram à
tona de certa maneira com a publicação do livro Os sertões, de Euclides da
Cunha que retrata com fidelidade o embate de Canudos e faz uma interpretação
sobre o ser sertanejo.
Fora algumas poucas intervenções
governamentais seja no Império ou no nascedouro republicano, o Nordeste era uma
terra de ninguém, pois o país vivia e respirava os ares da “cidade luz
tropical” o Rio de Janeiro e a cultura pátria era medida pelo que nela se
realizava, claro, que outros estados como por exemplo, São Paulo, tinham uma
certa influencia cultural “civilizatória', mas indiscutivelmente era a então
capital do país que puxava o samba enredo da recém criada Escola de Samba
Unidos da Republica Federativa do Brasil.
Mas se o sertanejo nordestino sempre
foi um forte em sua luta pela sobrevivência, foi também um obstinado divulgador
de sua própria cultura não deixando ainda que a região figurasse apenas como um
apêndice na geografia política do país e sim elemento integrador de uma noção
plena de brasilidade, com suas características regionais próprias, mas
sobretudo definindo a noção de nossa pluralidade cultural e reafirmando o
conceito pleno de nação em sua totalidade. Assim a contribuição do Nordeste
iria se somar a de outras regiões e o Brasil poderia descobrir-se sem discussão
de mérito, pois, a disputa em questão passaria ao largo de preconceitos ou
discriminações e serviria como afirmativa de nossa identidade.
Desse modo a partir do pressuposto da
nacionalização de nossa cultura os temas nordestinos tomam de assento o Rio de
Janeiro aproveitando-se da sua importância enquanto caixa de ressonância
nacional e passam a ser explorados por artistas e intelectuais vinculados as
suas tradições regionais para divulgar o que poucos conheciam, ou fingiam apenas
que existia.
Entre esses personagens responsáveis
por essa nacionalização/integração nordestina destaca-se Catulo da Paixão
Cearense, cuja referencia ao valoroso estado nordestino encontra-se apenas no
sobrenome, pois, nasceu, na cidade de São Luís do Maranhão em 31 de janeiro de
1863 e em 1880 foi residir no Rio de Janeiro com a família. Na capital do
império frequentou rodas de estudantes, foi boêmio, estivador, escriturário,
mas sobretudo poeta e violonista, atividades que o consagrariam como uma das
mais importantes figuras de seu tempo. Acompanhou de perto o crescimento da
modinha enquanto gênero de música urbana largamente executada em serenatas
sendo o seu grande impulsionador nos finais do século XIX e nas primeiras
décadas do seguinte.
Como poeta torna-se uma celebridade e o
Nordeste, o seu chão, a razão maior de sua poética. Seus livros vendiam-se aos
milhares e com eles descortinava um imenso horizonte para uma compreensão maior
desse lado do Brasil. Obras como O marrueiro, Sertão em flor, Alma do sertão, Um
caboclo brasileiro, Mata iluminada, O milagre de São João, O sol e a lua e
muitas outras revelaram liricamente um Brasil que os brasileiros precisavam
conhecer. Mas se seus versos eram largamente recitados e conhecidos por todos
suas modinhas ou as letras que fez para canções alheias, tinham o mesmo
sentimento lírico das noites enluaradas inebriadas pelo mágico encantamento das
serenatas noturnas da cidade que o abraçou, numa perfeita comunhão entre o
sertanejo puro e o urbano boêmio e sentimental, dois personagens num só, a
união perfeita de um Brasil que se mostra por inteiro, sem divisionismos e onde
a predominância de uma identificação matriz se une a uma cultura urbana e é
essa mistura na medida certa que da o caráter definidor de nosso caráter.
Como modinheiro, Catulo produziu uma
obra vastíssima e ajudou a fazer mais felizes as noites de luar de nosso país.
Parte dessa sua contribuição à música popular brasileira esta registrada em
três LPs produzidos pela gravadora Sinter entre os anos de 1955 e 1959 com
interpretações do radialista, cantor e compositor Paulo Tapajós. Em 1957 após o
sucesso do primeiro LP em 10 polegadas denominado Luar do sertão, é gravado o
disco Catulo, o poeta do sertão, com um repertório de canções representativas
do momento áureo da modinha brasileira. Dentre elas destacam-se, Vai ó
meu amor ao campo santo e Os olhos dela , com Irineu
de Almeida; Clélia, com Luiz de Souza; O poeta do
sertão ; Talento e formosura , com Edmundo Otávio
Ferreira; Rasga o coração e Palma de martírio ,
com Anacleto de Medeiros.
Todas essas musicas foram gravadas em
disco nos primeiros anos do século vinte e embalaram os corações do povo
brasileiro, nelas o poeta/compositor se deixa entregar por inteiro traduzindo
em versos e melodia um momento mágico de nossa cultura musical.
Luiz
Américo Lisboa Junior, in www. Luizamerico.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário